Princípio da insignificância: atipicidade material não se confunde com exclusão da punibilidade
LUIZ FLÁVIO GOMES ( www.blogdolfg.com.br )
Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP e Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Pesquisadores: Patricia Donati e Danilo F. Christófaro.
Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio. DONATI, Patricia. CHRISTÓFARO, Danilo. Princípio da insignificância: atipicidade material não se confunde com exclusão da punibilidade. Disponível em http://www.lfg.com.br 04 junho. 2009.
Decisão da Segunda Turma do STF: HABEAS CORPUS'. FURTO TENTADO DE VALOR ÍNFIMO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECONHECIDA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. CASO DE ATIPICIDADE. ABSOLVIÇÃO DO RÉU. PRECEDENTES DO STF. PELA CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da insignificância da conduta praticada pelo réu não conduz à extinção da punibilidade do ato, mas à atipicidade do crime e à conseqüente absolvição do acusado. 2. Pela concessão da ordem. Princípio da Insignificância: absolvição é diferente de não-punibilidade (STF, HC 98.152 , rel. Min. Celso de Mello).
Comentários: o STF (como temos enfatizado nos últimos tempos) vem reconhecendo e aplicando (quase sempre corretamente) o princípio da insignificância. No julgamento do HC 98152 o Ministro Celso de Mello, acertadamente, não só reconheceu a sua incidência, como também lhe conferiu a correta interpretação (e sistematização) dogmática.
O princípio da insignificância, como se sabe, não é uma causa excludente da punibilidade, mas, da própria tipicidade (material), o que traz importantes diferenças no tratamento jurídico conferido ao acusado. Para que se reconheça uma causa excludente da punibilidade o fato, antes de tudo, precisa ser punível. O fato para ser punível precisa, antes de tudo, ser típico.
A punibilidade se materializa na ameaça da pena. Se o fato típico (descrito na lei)é ameaçado com pena é punível. A punibilidade, nesse sentido, é um conceito inerente à previsão legal. Depois de cometido o delito, nasce para o Estado uma pretensão punitiva. Quando presente uma das excludentes da punibilidade, o fato não deixa de ser típico e ilícito, apenas não incide a reprimenda prevista. Sem dúvida, uma realidade completamente distinta da atipicidade.
O princípio da insignificância tem o condão de afastar a tipicidade material do fato, tendo como vetores para sua incidência: a) a mínima ofensividade da conduta, (b) a ausência de periculosidade social da ação, (c) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica.
Diante disso, descaracterizando-se o aspecto material do tipo penal, a conduta passa a ser atípica, o que impõe a absolvição do réu, não lhe restando consequência penal alguma. É exatamente esse aspecto relevante, que às vezes gera divergência entre o STF e o STJ, que acertadamente foi dirimido pelo Ministro Celso de Mello.
No caso em comento, uma vez reconhecido o princípio da insignificância, o STJ deveria, conforme visto, ter absolvido o réu e arquivado o processo (eliminando quaisquer efeitos penais). No entanto, não foi o que fez, reconhecendo, tão somente, a extinção da punibilidade, quando na verdade, sequer houve possibilidade de punibilidade (não existiu conduta punível), haja vista a atipicidade do fato. Que relevância tem no nosso país toda essa jurisprudência corretiva do STF!
1 Comentário
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Temos visto que o STF não é mais o supremo lugar da razão e da coerência, antes admirado como incorruptível, hoje está sob a nuvem da obscuridade e dos interesses mais escusos que alardeiam a nação, decepcionado, mas nem tanto, pois lá no fundo sempre suspeitava de alguns posicionamentos dos semideuses, mas como aquele marido traído que não quer aceitar, tentava tapar o sol com a peneira. Lamentável continuar lendo