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    Concurso de Pessoas, Princípio da Igualdade e Teoria Monista

    há 15 anos

    LUIZ FLÁVIO GOMES (www.blogdolfg.com.br) Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP e Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Pesquisadora: Áurea Maria Ferraz de Sousa.

    Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio. SOUSA, Áurea Maria Ferraz. Concurso de Pessoas, Princípio da Igualdade e Teoria Monista. Disponível em http://www.lfg.com.br 18 agosto de 2009.

    A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal deferiu habeas corpus , cassando decisão oriunda do STJ, no sentido de reconhecer a necessidade de aplicação da teoria monista a um dos co-autores de roubo, sob o argumento de que todos aqueles que contribuem para o crime incidem (em princípio) nas (mesmas) penas a ele cominadas. Questionamentos:

    1º) Em que âmbito do Direito penal insere-se a teoria monista?

    Trata-se de teoria adotada pelo Código Penal ao tratar do concurso de pessoas no artigo 29 que prescreve: Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.

    2º) No concurso de pessoas pode haver vários crimes?

    Sim. A depender da adoção de uma ou outra teoria, conforme explicaremos com mais clareza, é possível falar-se que no concurso de pessoas haveria um crime para os autores e outros para os partícipes, ou ainda, que há um crime distinto para cada participante.

    Informativo do STF, nº 554. Segunda Turma: Concurso de Pessoas: Teoria Monista e Fixação de Reprimenda mais Grave a um dos Co-réus. Por reputar não observada a teoria monista adotada pelo ordenamento pátrio (CP, art. 29) segundo a qual, havendo pluralidade de agentes e convergência de vontades para a prática da mesma infração penal, todos aqueles que contribuem para o crime incidem nas penas a ele cominadas, ressalvadas as exceções legais , a Turma deferiu habeas corpus cassar decisão do STJ que condenara o paciente pela prática de roubo consumado. No caso, tanto a sentença condenatória quanto o acórdão proferido pelo tribunal local condenaram o paciente e o co-réu por roubo em sua forma tentada (CP, art. 157, 2º, I e II, c/c o art. 14, II). Contra esta decisão, o Ministério Público interpusera recurso especial, apenas contra o paciente, tendo transitado em julgado o acórdão da Corte estadual relativamente ao co-réu. Assentou-se que o acórdão impugnado, ao prover o recurso especial, para reconhecer que o paciente cometera o crime de roubo consumado, provocara a inadmissível situação consistente no fato de se condenar, em modalidades delitivas distintas quanto à consumação, os co-réus que perpetraram a mesma infração penal. Destarte, considerando que os co-réus atuaram em acordo de vontades, com unidade de desígnios e suas condutas possuíram relevância causal para a produção do resultado decorrente da prática do delito perpetrado, observou-se ser imperioso o reconhecimento uniforme da forma do delito cometido. Assim, restabeleceu-se a reprimenda anteriormente fixada para o paciente pelo tribunal local. HC 97652/RS, rel. Min. Joaquim Barbosa, 4.8.2009.

    Comentários: a responsabilidade penal (como enfatizamos em nosso livro Direito Penal , vol. 2, São Paulo: RT, 2008), no concurso de pessoas, rege-se por algumas regras fundamentais, destacando-se:

    a) a punição do partícipe depende de uma conduta principal;

    b) a punição do partícipe ainda depende do início da execução;

    c) a responsabilidade penal é individual e

    d) cada um responde na medida de sua culpabilidade.

    Esta última regra se deve à previsão do artigo 29, do Código Penal, que impõe a penalidade ao agente de acordo e na medida da sua culpabilidade. Ou seja, cada autor e cada partícipe responde pelo que fez, consoante a relevância causal e jurídica de cada contribuição. O grau de responsabilidade de um deles não pode, automaticamente, passar para o outro, isso também em decorrência do princípio da individualização da pena (CF, art. , XLVI).

    O informativo em comento trouxe à baila decisão do Superior Tribunal de Justiça tomada por ocasião do julgamento de um REsp interposto pelo Ministério Público estadual, no qual se reconheceu que um dos co-réus teria cometido roubo consumado, quando em primeira e segunda instâncias decidiu-se que o outro co-réu teria cometido o crime na forma tentada. Ora, flagrante o equívoco cometido pelo Tribunal da Cidadania, o que devidamente foi corrigido pelo Supremo Tribunal Federal em respeitosa decisão, cuja relatoria é do Min. Joaquim Barbosa.

    Explica-se. É possível cogitar-se, no concurso de pessoas, se haveria um só crime ou vários crimes. A respeito do tema há três teorias explicativas: (a) a teoria unitária ou monista, (b) a teoria dualista e (c) a teoria pluralista. De acordo com a primeira, havendo concurso de pessoas haverá um só crime. Para a teoria dualista haveria na hipótese um crime para os autores e outro para os partícipes. A teoria pluralista, por sua vez, vai além e afirma que há um crime distinto para cada participante. Alerte-se, no entanto, para a adoção da primeira teoria pelo nosso Código Penal, de acordo com o qual o crime é único para todos que concorrem para ele (seja na modalidade de co-autoria, seja na forma de participação). Ou seja, quando várias pessoas, com vínculo subjetivo , concorrem para o delito, todas respondem por este mesmo delito.

    Com isso concordamos com a decisão proferida em sede de Habeas Corpus pelo Supremo, pois embora o artigo 29 atribua penalidade ao agente de acordo e na medida de sua culpabilidade, se há vínculo subjetivo, ou seja, havendo unidade de desígnios e suas condutas tiveram a mesma relevância causal para a produção do mesmo resultado não há que se cogitar de medidas sancionatórias distintas. Ademais, se o fato consumou para um dos co-réus, sendo a consumação um requisito objetivo, por que não haveria de ter consumado para o outro? A contrario sensu , se para o primeiro co-réu, para quem a decisão transitou em julgado, reconheceu-se a forma tentada, o impetrante do HC, co-réu do mesmo fato, deve ser punido pela tentativa de roubo.

    O tratamento igualitário, quando todos os concorrentes acham-se em pé de igualdade, decorre do princípio (constitucional) da igualdade. Ofende a consciência humana tratar desigualmente duas pessoas iguais (ou dois fatos iguais). A teoria monista (ou unitária) nada mais é que extensão do princípio da igualdade (todos que concorrem para o delito se sujeitam às penas desse delito). A esses princípios que norteiam o direito justo é que se curvou a acertada decisão da Segunda Turma do STF (relatoria do Min. Joaquim Barbosa). Por força da teoria monista, se o crime é tido como tentado para um co-autor, não pode o outro responder por crime consumado. Todos que concorrem para o mesmo crime devem receber tratamento igualitário no que diz respeito à classificação jurídica desse fato. Reputar o delito consumado para um e tentado para outro significa menosprezar a igualdade.

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    1 Comentário

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    Acredito que seja válida a observação que apesar do CP brasileiro adotar a teoria monista, no seu Art. 29, CP, existem casos de exceções pluralista, previstas nos Art. 124 e 126 e Art. 317 e 333. continuar lendo