Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
1 de Maio de 2024
    Adicione tópicos

    Legalistas versus constitucionalistas na questão da tipicidade do porte de arma desmuniciada

    há 15 anos

    NOTÍCIAS (Fonte: www.stf.jus.br)

    Segunda Turma nega habeas corpus a portador de arma sem munição

    A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal negou Habeas Corpus (HC 91853) requerido pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em favor de Roberto de Souza, condenado a três anos de prisão em razão do crime de porte de arma. O argumento da defesa de que a arma não continha munição e que, portanto, não estariam configurados o potencial lesivo e a tipicidade da conduta, não foi acolhido. O voto do relator, ministro Eros Grau, negando a concessão da ordem, foi seguido à unanimidade.

    O subprocurador-geral da República presente à sessão, Wagner Gonçalves, afirmou que, independentemente de estar com ou sem munição, uma arma é sempre um instrumento de perigo e ameaça que representa conturbação social no momento em que é utilizada. No caso em questão, Roberto de Souza foi condenado à pena mínima de três anos prevista no artigo 16 do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.823/2006), que dispõe sobre a posse de arma de fogo de uso restrito. O parecer da PGR foi acolhido pelo relator. O pedido já havia sido negado em decisão monocrática por ministro do Superior Tribunal de Justiça.

    NOTAS DA REDAÇAO

    Contrariando entendimento já exposto anteriormente, a Segunda Turma do STF, desta vez, rechaçou os argumentos de atipicidade da conduta daquele que porta arma desmuniciada. Por ocasião do julgamento HC 99449/MG (rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, 25.8.2009), quando os fatos relacionavam-se ao porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14, Lei 10.826/2003), a mesma Segunda Turma expôs o seguinte entendimento no informativo de nº 557:

    SEGUNDA TURMA

    Porte Ilegal de Arma e Ausência de Munição

    O fato de a arma de fogo encontrar-se desmuniciada torna atípica a conduta prevista no art. 14 da Lei 10.826/2003 [Portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.]. Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (Lei 10.826/2003, art. 14), haja vista que a arma encontrava-se desmuniciada. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que, por reputar típica a conduta em tela, indeferia o writ . HC 99449/MG , rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, 25.8.2009. (HC-99449)

    Na ocasião, manifestamo-nos no sentido de expor que a decisão poderia ter sido fundamentada na teoria constitucionalista do delito, de acordo com a qual, o tipo penal nos crimes dolosos é a soma da tipicidade formal (ou objetiva), com a tipicidade material (ou normativa), mais a tipicidade subjetiva. Da tipicidade material fazem parte dois juízos valorativos distintos: o juízo de desaprovação da conduta e o juízo de desaprovação do resultado jurídico. O resultado jurídico (lesão ou perigo concreto de lesão ao bem jurídico) para ser desaprovado / desvalioso ainda precisa reunir seis características: (a) concreto; (b) transcendental; (c) grave (não insignificante), (d) intolerável, (e) objetivamente imputável ao risco criado e (f) que o resultado esteja no âmbito de proteção da norma. Assim, nas lições do professor Luiz Flávio Gomes, somente quando reunidas todas essas características é que o resultado jurídico será admitido como expressão do sentido material da tipicidade. Sendo a quarta exigência a intolerabilidade da ofensa, ou seja, além de real, transcendental e grave, o resultado jurídico deve ser também intolerável (desarrazoado), conclui-se que o fato é atípico quando não perturba seriamente o convívio social. Portar uma arma de fogo desmuniciada não seria uma conduta de todo desaprovada, na visão da Segunda Turma, na oportunidade em que julgou o HC 99449/MG .

    A questão, em verdade, está na orientação seguida por cada Ministro. Aqueles mais legalistas repudiam a visão constitucionalista do delito, sendo perfeitamente possível falar-se em perigo abstrato. Os constitucionalistas, por sua vez, afastam peremptoriamente esse modelo de perigo, para os quais relevante mesmo é o perigo concreto.

    Por oportuno trazer o conceito de Gustavo Junqueira, quanto ao que venha a ser crime de perigo concreto e crime de perigo abstrato. De acordo com suas lições, constata-se um crime de perigo abstrato quando a norma presume o risco ao bem jurídico a partir, tão somente, da prática da conduta descrita no tipo, ou seja, quando a norma parece se referir diretamente à conduta, e não à criação de risco juridicamente desaprovado. Crime de perigo concreto, por outro lado, verifica-se quando, além da prática da conduta, é preciso gerar realmente um incremento proibido de risco ao bem concretamente considerado.

    Parece mesmo que a tendência é no sentido da negação daquele primeiro modelo de perigo. Fala-se hoje em Direito Penal Democrático o qual só pode existir para proteger bens jurídicos e atuar quando houver real lesão ou risco de lesão.

    • Sobre o autorTradição em cursos para OAB, concursos e atualização e prática profissional
    • Publicações15364
    • Seguidores876147
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações767
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/legalistas-versus-constitucionalistas-na-questao-da-tipicidade-do-porte-de-arma-desmuniciada/1970182

    Informações relacionadas

    Dano ambiental individual gera indenização

    Editora Revista dos Tribunais
    Doutrinahá 3 anos

    6. Direito Processual Penal Coletivo e a Tutela dos Bens-Jurídicos Penais Coletivos Fundamentais: Direitos ou Interesses Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)