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24 de Abril de 2024
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    Tráfico de drogas admite penas substitutivas

    há 14 anos

    LUIZ FLÁVIO GOMES (www.blogdolfg.com.br)

    Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP e Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. Blog: www.blogdolfg.com.br Pesquisadora: Áurea Maria Ferraz de Sousa

    Como citar este artigo : GOMES, Luiz Flávio. Tráfico de drogas admite penas substitutivas . Disponível em http://www.lfg.com.br - 6 abril de 2010.

    De maneira louvável e magistral o Min. Ayres Britto admitiu todos os fundamentos que já vínhamos defendendo desde a edição da Lei 11.343/06 no tocante à possibilidade de se substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no tráfico ilícito de drogas (STF, HC 97.256-RS, rel. Min. Ayres Britto, Informativo 579). Segue um trecho da decisão:

    O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus, afetado ao Pleno pela 1ª Turma, em que condenado à pena de 1 ano e 8 meses de reclusão pela prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes (Lei 11.343/2006, art. 33, ) questiona a constitucionalidade da vedação abstrata da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos disposta no art. 44 da citada Lei de Drogas (Os crimes previstos nos arts. 33, caput e 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.). Sustenta a impetração que a proibição, no caso de tráfico de entorpecentes, da substituição pretendida ofende as garantias da individualização da pena (CF, art. , XLVI), bem como aquelas constantes dos incisos XXXV e LIV do mesmo preceito constitucional v. Informativo 560. O Min. Ayres Britto, relator, concedeu parcialmente a ordem e declarou incidentalmente a inconstitucionalidade da expressão vedada a conversão em penas restritivas de direitos, constante do citado 4º do art. 33, e da expressão vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos, contida no também aludido art. 44, ambos dispositivos da Lei 11.343/2006.

    Um dos primeiros argumentos lançados pelo Min. Ayres Britto foi o seguinte: no tempo da lei anterior de drogas já eram admitidas penas substitutivas para o tráfico de drogas (STF, HC 85894/RJ, DJE de 28.9.2007). De outro lado, o que existe de peculiar no capítulo que versa sobre direitos e garantias individuais, historicamente oponíveis ao Estado, inclusive ao estado legislador, é que ele ampliar a esfera de liberdade das pessoas naturais e não a estreita, ou, por qualquer modo, não encurta esse espaço de movimentação humana.

    De acordo com o art. 44 da referida lei, o tráfico de drogas é insuscetível de: a) sursis, b) graça, indulto ou anistia, c) liberdade provisória e d) conversão da pena de prisão em restritiva de direitos. Entretanto, não bastassem todas as razões que já viciavam (parcialmente) a norma de inconstitucionalidade (naquilo em que o legislador ordinário foi além do gizamento constitucional), com o advento da Lei 11.464/2007 a vedação (das penas substitutivas) perdeu sentido, visto que o regime integralmente fechado foi abolido do nosso sistema jurídico. Todo crime hoje, no Brasil, inclusive os hediondos, admite a progressão de regime, porque todo crime está sujeito à individualização da pena.

    Uma vez extinta a previsibilidade, na lei de crimes hediondos, do cumprimento de pena em regime integralmente fechado, desapareceu também a proibição para a substituição da pena de prisão por restritiva de direitos. Seria um disparate admitir as substitutivas para crimes hediondos não violentos e afastar o mesmo benefício só para o delito de tráfico de entorpecente. Semelhante conclusão violaria, de modo flagrante, o princípio da igualdade (isonomia).

    No entanto, como dissemos, por ocasião do julgamento do HC 97.256-RS, cujos fundamentos foram publicados no Informativo 579, do Supremo Tribunal Federal, o Ministro Ayres Britto, com o brilhantismo que lhe é peculiar, apresentou vastas razões a justificar a inconstitucionalidade da norma prescrita do artigo 44 da Lei Antidrogas (na parte final) .(proibição da substituição da pena de prisão por restritivas de direitos)

    De acordo com o Ministro, o primeiro fundamento a ser levado em consideração para a conclusão da inconstitucionalidade da norma atacada (parte final do art. 44) reside na interpretação que deve ser feita do inciso XLIII do artigo da Constituição Federal (que cuida dos crimes hediondos), que por se tratar de norma constitucional restritiva de direitos ou de garantias fundamentais há de ser contidamente interpretada. Não podendo daí extrair-se o argumento de que a própria Lei Maior teria permitido a reprimenda excessiva imposta pelo artigo 44.

    A segunda, e não menos importante proposição interpretativa a ser feita no tema, é a garantia da individualização da pena que, claramente, é violada com o preceito legal ora combatido. Nas sábias palavras do Ministro, a lei comum não pode subtrair a força do juiz sentenciante que se incumbe do poder-dever de impor a sanção criminal individualizadamente, balanceando as circunstâncias objetivas e subjetivas do fato. Não se pode subtrair da instância julgadora a possibilidade de agir com discricionariedade nos quadrantes da sanção. Pois o que se vê no artigo 44 e também no artigo 33, 4º, da mesma lei, é taxatividade pura e seca de que todo e qualquer agente que pratique o crime de tráfico esteja na mesma situação jurídica subjetiva, com o que não podemos concordar. Cada réu é um réu, cada crime é um crime (cabe ao juiz distinguir claramente cada situação, cada pessoa, consoante o mandamento constitucional da individualização da pena).

    Ademais, não se pode perder de vista que muitas vezes o cumprimento de pena no regime fechado não faz surtir os efeitos para os quais a pena é imposta ao transgressor. Como se sabe, a pena tem caráter retributivo-preventivo, mas também ressocializador. Ora, é de conhecimento notório a situação do sistema carcerário brasileiro: caótica!

    Neste sentido é que propomos a adesão às penas alternativas, pois elas podem, no caso concreto (e aí é que ressaltamos a fundamental importância do papel cognitivo do julgador que, próximo do autor e das circunstâncias todas que o levaram a transgredir a norma, tem melhor condição de avaliar a necessidade de reprimenda maior ou menor), apresentar mais eficácia que o cárcere.

    Estamos com a aula magistral do Ministro Ayres Britto e no aguardo do pronunciamento do Min. Joaquim Barbosa, a quem os autos (que estão afetos ao Plenário da Corte) foram enviados, por pedido de vista. Tudo que for possível ser feito para evitar os cárceres brasileiros deve ser feito. É da natureza humana refutar o horror, em nome dos avanços civilizatórios.

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