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19 de Abril de 2024
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    Direito à educação garantido pelo TJMG. Harmonia com STJ e STF.

    há 14 anos

    FONTE (www.tjmg.jus.br) TJMG garante matrícula de criança

    A 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) garantiu a P.E.A. o direito de se matricular na escola pública Tiradentes, em Belo Horizonte.

    Consta dos autos que a forma de ingresso nessa escola é por meio de sorteio e para estudar no local é necessário que a criança não esteja matriculada em outra instituição. P.E.A. foi sorteado para matricular-se na 1ª série do ensino fundamental, entretanto, a diretora rejeitou sua inscrição sob o argumento de que a mãe do garoto mentiu quando do preenchimento da matrícula. Ao contrário do que a mãe informou, a diretora afirma que o garoto já cursava a 1ª série do ensino fundamental em outro colégio da rede privada.

    P.E.A., representado por sua mãe, ajuizou mandado de segurança para garantir sua matrícula. Em 1ª Instância, o juiz acolheu a liminar determinando que a instituição de ensino aceitasse o garoto. Discordando da decisao, o Estado de Minas Gerais impetrou agravo regimental no Tribunal de Justiça. Mas o relator, desembargador Wander Marotta, entendeu que a escola deveria aceitar a criança sob o fundamento de que a educação é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal: Não pode o Estado erguer barreiras burocráticas, ensejando obstaculizar ou mesmo impedir o acesso de menores carentes a escolas públicas, visto que a educação é direito fundamental, assegurado pela Constituição Federal e não pode ser restringido. O menor não pode ser penalizado em razão de ato pouco recomendável praticado por sua representante legal destacou.

    Votaram de acordo com o relator os desembargadores Belisário de Lacerda e André Leite Praça.

    NOTAS DA REDAÇAO

    A Constituição de 1967 limitava-se a afirmar ser a educação um direito de todos e dever do Estado. Em 1988, a Carta Magna manteve a norma e aprofundou-se estabelecendo a educação como um direito social e dedicando-lhe capítulo próprio a partir do art. 205.

    Sendo a educação um dever do Estado, este deve garantir a todos o acesso à escola.

    A importância desse entendimento foi reiterada recentemente, com a promulgação da Emenda Constitucional 64, de 04 de fevereiro de 2010, que incluiu também a alimentação como um direito social no art. . Observe-se que, embora não estabeleça uma hierarquia entre os demais direitos ali previstos, referida Emenda manteve a educação como o primeiro registro. É a atual redação do artigo:

    Art. 6º. São direitos sociais a educação , a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifamos)

    Adiante, aConstituiçãoo pormenoriza:

    Capítulo III DA EDUCAÇAO, DA CULTURA E DO DESPORTO Seção I DA EDUCAÇAO

    Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família , será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

    Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; (...)

    Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; II - progressiva universalização do ensino médio gratuito; (...) 1º - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo . 2º - O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente . (...)

    Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade , o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação , ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (grifamos)

    REGINA MARIA FONSECA MUNIZ[ 1 ] ensina que as normas constitucionais acima "hão de ser entendidas como de eficácia plena e aplicabilidade imediata, produzindo efeitos jurídicos, onde todos são investidos no direito subjetivo público, com o efetivo exercício e gozo".

    O novo olhar constitucional sobre a educação resultou numa maior provocação do Judiciário para intervir no sistema educacional.

    CARLOS ROBERTO JAMIL CURY e LUIZ ANTÔNIO MIGUEL FERREIRA[ 2 ], em excelente trabalho sobre a judicialização da educação, acrescentam que

    Diante desta nova realidade e dos conflitos e problemas oriundos desta relação, fica evidente que a intervenção judicial não mais se limita a questões como a da responsabilidade civil dos educadores ou criminal dos pais ou responsáveis. Novos questionamentos relacionados à educação são levados diariamente ao Poder Judiciário, que passou a ter uma relação mais direta, com uma visão mais social e técnica dos problemas afetos à educação.

    A movimentação judicial para efetivação da letra da lei também encontra respaldo no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90):

    Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade , a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação , ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. (...)

    Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação , visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; (...) V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência. (...)

    Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente : I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio; (...) 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente . (grifamos)

    Outra fonte de regulamentação da educação no Brasil repete esses valores: Lei de Diretrizes e Bases da Educacao Nacional (Lei 9.394/96)

    Art. 2ºA educação, dever da família e do Estado , inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

    Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; (...) VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; (...)

    Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de : I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; II - universalização do ensino médio gratuito; X - vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) anos de idade.

    Art. 5ºO acesso ao ensino fundamental é direito público subjetivo , podendo qualquer cidadão, grupo de cidadãos, associação comunitária, organização sindical, entidade de classe ou outra legalmente constituída, e, ainda, o Ministério Público, acionar o Poder Público para exigi-lo . (...) 2º Em todas as esferas administrativas, o Poder Público assegurará em primeiro lugar o acesso ao ensino obrigatório , nos termos deste artigo, contemplando em seguida os demais níveis e modalidades de ensino, conforme as prioridades constitucionais e legais. 3º Qualquer das partes mencionadas no caput deste artigo tem legitimidade para peticionar no Poder Judiciário , na hipótese do 2º do art. 208 da Constituição Federal, sendo gratuita e de rito sumário a ação judicial correspondente. 4º Comprovada a negligência da autoridade competente para garantir o oferecimento do ensino obrigatório, poderá ela ser imputada por crime de responsabilidade . (...) (grifamos)

    Em observância aos textos legais, o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e da Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB) e o Plano Nacional de Educação estabeleceram suas diretrizes no mesmo sentido.

    A criança e o adolescente são sujeitos de um direito social e público subjetivo ou seja, ícone de primeira responsabilidade do Estado e sociedade. Todas as medidas devem ser tomadas para a efetivação desse valor legal.

    Recentemente, em 20 de abril do ano corrente, o Superior Tribunal de Justiça julgou o Recurso Especial 1.185.474/SC, sobre o direito de acesso à escola de menores de zero a seis anos.

    Num raciocínio equilibrado, o Ministro HUMBERTO MARTINS lembrou sobre a teoria da reserva do possível, "segundo a qual os direitos sociais a prestações materiais dependem da real disponibilidade de recursos financeiros por parte do Estado". No entanto, pondera o Ministro que

    Quando não há recursos suficientes para prover todas as necessidades, a decisão do administrador de investir em determinada área implica escassez de recursos para outra que não foi contemplada. A título de exemplo, o gasto com festividades ou propagandas governamentais pode ser traduzido na ausência de dinheiro para a prestação de uma educação de qualidade.

    E avança afirmando que "a realização dos Direitos Fundamentais não é opção do governante". Soma-se a isso a teoria do mínimo existencial, segundo a qual "a impossibilidade de concretização de todos os direitos sociais não impede que as pessoas possam pleitear, no mínimo, o acesso a condições mínimas para uma vida digna".

    Não há dúvidas de que a educação integra o mínimo existencial, pois prepara o ser humano para uma vida digna e concede-lhe discernimento no exercício da cidadania.

    Diante da imprescindibilidade do direito pleiteado, e em harmonia com o entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 436.996/SP, que também trabalhou a questão, o Superior Tribunal de Justiça priorizou o direito fundamental de acesso à escola.

    É sensato que a medida judicial seja adotada somente quando esgotados os veículos de diálogo entre a instituição de ensino e o interessado. Recorrer ao Judiciário sem percebê-lo como última via sobrecarrega um sistema que já sofre com excessos, e deságua em medidas legais excessivas sobre situações que poderiam ser solucionadas administrativamente.

    O ideal é seria que a rede pública educacional atendesse nossas crianças e adolescentes não com critérios subjetivos instituídos pela direção de cada escola, mas com a responsabilidade e eficácia que, não fosse a má administração do orçamento público, seria viável, possível.

    A ausência de política pública eficaz provoca a atuação do Judiciário para a efetivação do direito de educação, assegurado a todos como dever do Estado. E a ineficiência do Executivo, nesse aspecto, não oferece aos magistrados alternativa diversa da que temos visto. Não se trata de ingerência jurídica. Para o amparo de nossas crianças e adolescentes, tornou-se verdadeira questão de Justiça.

    Notas de rodapé:

    1.MUNIZ, Regina Maria Fonseca. O direito à educação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 122. 2. CURY, Carlos Roberto Jamil e FERREIRA, Luiz Antônio Miguel. A judicialização da educação. Revista CEJ. Brasília: Ano XIII, n. 45, p. 35, abr/jun 2009.

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