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19 de Abril de 2024

ARTIGOS DO PROF. LFG: Repatriamento de dinheiro ilegal no exterior: uma imoralidade (?)

há 13 anos

LUIZ FLÁVIO GOMES

Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri e Mestre em Direito Penal pela USP. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. Blog: www.blogdolfg.com.br. Encontre-me no Facebook.

Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio. Repatriamento de dinheiro ilegal no exterior: uma imoralidade (?). Disponível em http://www.lfg.com.br - 28 de dezembro de 2010.

De US$ 50 a 200 bilhões de dólares poderiam ser repatriados (regressados à Pátria Amada, salve, salve), caso fosse aprovado o projeto Cidadania Fiscal (354/2009) [veja o estimado leitor como os privilégios de classe sempre contam com nomes respeitosos: cidadania], de autoria do senador Delcídio Amaral (PT-MS), que está tramitando no Senado, com boa perspectiva de aprovação (talvez em breve).

O dinheiro trazido de volta (repatriado), diz o senador, poderá ser investido em infraestrutura, habitação, agronegócio, ciência e tecnologia. O senador Garibaldi Alves (PMDB-RN) recomendou a sua aprovação.

Do que se trata?

Do seguinte: quem mandou dinheiro para o estrangeiro (para bancos europeus, especialmente os suiços, americanos etc.), ou manteve esse dinheiro lá, de forma ilegal [pelas leis vigentes no Brasil, de maneira criminosa], ganharia (de sobra) uma anistia criminal, em relação a todos os crimes fiscais e financeiros, incluindo os crimes contra a administração pública: falsidades, fraudes.

Basta que a pessoa física faça a retificação da declaração do IR e, em lugar de pagar a alíquota de 27,5%, pagaria apenas 5% sobre o valor dos bens. A alíquota cai pela metade se os bens forem aplicados em algumas áreas (definidas no projeto) ou em fundos de investimentos. As pessoas jurídicas pagariam alíquotas entre 8% e 10%. Não é preciso repatriar todo o dinheiro. A anistia vale mesmo que só parte do dinheiro venha para o Brasil.

Alguns juízes não concordam

Para Sérgio Moro (juiz federal) O projeto é uma vergonha. De acordo com Gabriel Wedy (presidente da Associação dos Juízes Federais), O Brasil não pode aceitar esse tratamento benéfico ao capital que vai para o exterior de forma criminosa, na maioria das vezes fruto da corrupção ou do tráfico internacional de drogas (O Estado de S. Paulo de 24.12.10, p. A4). A anistia, na prática, diz o primeiro juiz citado, não vai beneficar apenas os crimes fiscais, de descaminho e financeiros, evasão de divisas, vai favorecer todo tipo de criminoso; vai ser difícil descobrir a origem do dinheiro (que pode ser de corrupção). Tratamento privilegiado para corruptos. Isso viola a moralidade. Por mais que a intenção seja a de atrair recursos para investimentos, creio que os prejuízos à moralidade e o incentivo à sonegação não compensam (diz o juiz Ivo Höhn Junior).

Senador Delcídio e alguns advogados defendem o projeto

Para o senador O Projeto não é uma aventura. Tenta regularizar o câmbio negro. Tem inspiração em outros projetos da Alemanha, Itália etc. Muito dinheiro bom foi para fora do país [era uma questão de proteção contra os planos econômicos] (O Estado de S. Paulo de 24.12.10, p. A4). Alguns advogados (Sérgio Rosenthal, Toron, G. Batochio) concordam com as justificativas do senador. Pitombo acha que o crime de evasão de divisas não deveria existir.

Nossa opinião

Do ponto de vista dos beneficiados (político-governamental, das pessoas implicadas, dos administradores de fortunas no Brasil etc.) o projeto certamente deveria se transformar em lei (o mais pronto possível). Mas por detrás desse projeto há questões morais, políticas e filosóficas extremamente graves (que precisam ser colocadas em pauta).

As classes dominantes continuam zombando da igualdade. Sempre querem ser mais iguais que os outros. Adoram e não abrem mão dos privilégios. O Iluminismo, que retrata o tempo da modernidade, ainda não chegou ao Brasil. Crimes das classes dominadas, ao contrário, são resolvidos (inescapavelmente) com a prisão. E não precisa o marginalizado (o apartheidizado) fazer muita coisa não. Sua vulnerabilidade é extrema. Não é dessa maneira que vamos construir uma nação.

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