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27 de Abril de 2024
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    Artigos - A revolução da brevidade

    há 15 anos

    Como citar este artigo: ROBALDO, José Carlos de Oliveira. A revolução da brevidade. Disponível em http://www.lfg.com.br. 01 de abril de 2009.

    Na colação de grau de Direito da turma diurna de 2008, da UFMS de Campo Grande, que aconteceu na semana passada no Palácio Popular da Cultura, nas minhas palavras como paraninfo daquela seleta turma, optei, com o propósito de chamar a atenção dos novos graduados, por reproduzir o tema A revolução da brevidade, de autoria do constitucionalista carioca Luís Roberto Barroso, um dos maiores juristas da atualidade do cenário brasileiro.

    A escolha do tema ocorreu devido à sua pertinência, sobretudo em face das novas exigências do mundo moderno ou pós-moderno, onde a velocidade e a brevidade da informação se tornaram fatores imprescindíveis à dinâmica das nossas ações.

    A modernidade, de fato, exige de nós, sem perder a qualidade, uma maior objetividade, rapidez, clareza nas nossas comunicações. Os nossos recados ou posicionamentos devem ser dados de forma a motivar o diálogo, a interação, sem consumirmos muito tempo dos nossos interlocutores. Se o nosso tempo é limitado, com certeza, o tempo dos outros também o é; se temos dificuldades para assimilarmos a terminologia técnica ou o eruditismo exagerados, por certo, os demais também os têm.

    Naquela oportunidade, com o pedido de escusas ao autor e às pessoas presentes, o que também faço nesta ocasião aos nossos leitores, transcrevo - quase na integra - as palavras do aludido autor:

    "Toda área do conhecimento humano tem a sua beleza, as suas circunstâncias e as suas dificuldades. O mundo jurídico, tradicionalmente, debate-se com duas vicissitudes: (a) a linguagem empolada e inacessível; e (b) os oradores ou escribas prolixos, que consomem sem dó o tempo alheio. Verdade seja dita, no entanto, o primeiro problema vem sendo superado bravamente: as novas gerações já não falam nem escrevem com a obscuridade de antigamente.

    De fato, em outra época, falar difícil era tido como expressão de sabedoria.

    Chamar autorização do cônjuge de"outorga uxória"ou recurso extraordinário de"irresignação derradeira"era sinal de elevada erudição. Hoje em dia, quem se expressa assim é uma reminiscência jurássica.

    Nos dias atuais, a virtude está na capacidade de se comunicar com clareza e simplicidade, conquistando o maior número possível de interlocutores. A linguagem não deve ser um instrumento autoritário de poder, que afaste do debate quem não tenha a chave de acesso a um vocabulário desnecessariamente difícil.

    Essa visão mais aberta e democrática do direito ampliou, significativamente, a interlocução entre juristas e tribunais, de um lado, e a sociedade e os meios de comunicação, de outro...

    Pois agora que finalmente conseguimos nos comunicar com o mundo, depois de séculos falando para nós mesmos, está na hora de fazermos outra revolução: a da brevidade, da concisão, da objetividade. Precisamos deixar de escrever e de falar além da conta. Temos de ser menos chatos.

    Conta-se que George Washington fez o menor discurso de posse na Presidência dos Estados Unidos, com 133 palavras. William Harrison fez o maior, com 8.433, num dia frio e tempestuoso em Washington. Harrison morreu um mês depois, de uma gripe severíssima que contraiu naquela noite. Se não foi uma maldição, serve ao menos como advertência aos expositores que se alongam demais" .

    Após essas reflexões, aludido autor nos transmite duas sugestões sobre o tema. "A primeira importa em cortar na própria carne. Petições de advogados (acrescento, também, de promotores de justiça) devem ter um limite máximo de páginas. Pelo menos as idéias centrais e o pedido têm que caber em algo assim como 20 laudas. Se houver mais a ser dito, deve estar como anexo, e não no corpo principal da peça. Aliás, postulação que não possa ser formulada nesse número de páginas dificilmente será portadora de bom direito.

    Einstein gastou uma página para expor a teoria da relatividade. É a qualidade do argumento, e não o volume de palavras, que faz a diferença. A segunda sugestão corta em carne alheia. A leitura de votos extremamente longos, ainda quando possa trazer grande proveito intelectual para quem os ouve, torna os tribunais disfuncionais. Com o respeito e o apreço devidos e merecidos - e a declaração é sincera, e não retórica -, isso é especialmente verdadeiro em relação ao Supremo Tribunal Federal.

    Registro, para espantar qualquer intriga, que o tribunal, sob a Constituição de 1988, vive um momento de virtuosa ascensão institucional, com sua composição marcada pela elevada qualificação técnica e pelo pluralismo. Todos os meus sentimentos, portanto, são bons, e o comentário tem natureza construtiva. O fato é que, nas sessões plenárias, muitas vezes o dia de trabalho é inteiramente consumido com a leitura de um único voto. E a pauta se acumula. E o pior: como qualquer neurocientista poderá confirmar, depois de certo tempo de exposição, os interlocutores perdem a capacidade de concentração e a leitura acaba sendo para si próprio.

    Não há problema em que a versão escrita do voto seja analítica. A complexidade das questões decididas pode exigir tal aprofundamento. Mas a leitura em sessão deveria resumir-se a 20 ou 30 minutos, com uma síntese dos principais argumentos. Ou, em linguagem futebolística, um compacto com os melhores momentos.

    A revolução da brevidade tornará o mundo jurídico mais interessante, e a vida de todos nós, muito melhor. Quem sabe um dia chegaremos à capacidade de síntese do aluno a quem a professora determinou que escrevesse uma redação sobre" religião, sexo e nobreza ", mas que fosse breve. Seguindo a orientação, o jovem produziu o seguinte primor de concisão: 'Ai, meu Deus, como é bom, disse a princesa ainda ofegante'".

    Esse recado, por certo, também se adéqua ao profissional da medicina, sobretudo, em relação ao exagero da terminologia técnica. O puxão de orelha, a rigor, cabe a todos nós, inclusive nas audiências!

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