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27 de Abril de 2024

Tribunal gaúcho reconhe dignidade da pessoa humana aos travestis

há 15 anos

NOTÍCIA (Fonte: www.tjrs.jus.br)

Travesti pode mudar nome mesmo sem cirurgia para troca de sexo

É pelo nome que o indivíduo se identifica e são as ações, modo de vida e a condição pessoal de cada um que determinam sua verdadeira identidade. Esse é o entendimento da 8ª Câmara Cível do TJRS que, confirmando decisão de 1º Grau, atendeu pedido de travesti que buscava alterar seu nome registral de masculino para feminino, mesmo sem ter realizado cirurgia para troca de sexo.

O relator, Desembargador Rui Portanova, destacou que o tema apesar de não ser novo, é controvertido: a possibilidade de alterar o nome de uma pessoa que vive identidade diferente de seu sexo biológico. Salientou que no caso presente, o autor da ação alega que seu nome masculino não retrata sua identidade social, que é feminina, e todos a conhecem pelo nome de mulher. Relata ainda seu constrangimento em toda a ocasião que tem que revelar seu nome de registro.

O magistrado ressaltou não ser necessário classificar se a pessoa é transexual ou travesti, pois para analisar o caso é preciso apenas reconhecer sua condição de "ser humano e digno". Enfatizou a importância de olhar "não para os critérios diferenciadores, mas para aqueles que igualam todos e permitem o pleno exercício da sua condição de pessoa humana. E esses critérios estão no reconhecimento do direito à liberdade e à dignidade humanas."

Apontou que o autor quer se sentir bem com a condição social expressada pelo seu nome e tudo o que ele representa coletiva e individualmente. Para o magistrado, a insatisfação com um nome em descompasso com a identidade impede a pessoa de viver com dignidade e alimenta um sentimento de total inadaptação. Concluiu que é irrelevante definir se a pessoa é transexual ou travesti, ou mesmo saber se fará cirurgia para mudança de sexo, bem como a sua orientação sexual, uma vez que seu nome deve ser alterado porque se vê e é vista por todos como mulher.

A sessão ocorreu em 16/4. Acompanharam o voto do relator os Desembargadores Claudir Fidélis Faccenda e José Ataídes Siqueira Trindade.

NOTAS DA REDAÇÃO

Segundo o Código Civil de 2002 o nome é considerado um dos direitos da personalidade conferido a toda pessoa como um sinal diferenciador que individualiza e identifica a pessoa, portanto, inerentes à pessoa e indispensável para o exercício da personalidade com dignidade.

Conforme dispõe o art. 11 do Código Civil de 2002 os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis. São também absolutos (no sentido de serem oponíveis erga omnes ), imprescritíveis quanto a sua proteção, inatos (pois são incorporados naturalmente à pessoa), vitalícios e extrapatrimoniais.

O nome tem os seguintes elementos: prenome (indicação do titular, individualização da pessoa); sobrenome ou patronímico (indicativo da origem, da família) e agnome (elemento diferenciador entre pessoas que possuem o mesmo nome e estão n amesma família, ex: Júnior, Neto).

Por outro lado, não são elementos do nome títulos nobiliárquicos (nobreza), pseudônimo/heterônimo (mas gozam de proteção tal como o nome) e hipocorístico (o nome utilizado pessoal e profissionalmente, como Lula, Pelé, Xuxa) que poderá ser acrescido ao nome ou substituído pelo prenome se comprovado que é por ele identificado, podendo até passar a ser elemento do nome. ( Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios. (Redação dada pela Lei nº 9.708 , de 1998) )

A regra era da inalterabilidade absoluta do nome, mas a partir de 1998 a Lei de Registro Públicos (6.015/73) a inalterabilidade passou a ser relativa, de modo que é possível a mudança de nome nos casos previstos em Lei e também em outros casos justificados (conforme previsão do art. 56 , Lei 6.015 /76) os quais somente serão autorizados por decisão judicial, nos termos do art. 57 , a seguir:

Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa. (Renumerado do art. 57, pela Lei nº 6.216 , de 1975).

Art. 57 - Qualquer alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandato e publicando-se a alteração pela imprensa. (Renumerado do art. 58 com nova redação pela Lei nº 6.216 , de 1975).

Dentre as hipóteses legais o nome poderá ser alterado em razão de casamento, divórcio, adoção, estrangeiro que adquire a nacionalidade e de pessoa que esteja sob o programa de proteção à testemunha ( Art. 58, Parágrafo único. A substituição do prenome será ainda admitida em razão de fundada coação ou ameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, por determinação, em sentença, de juiz competente, ouvido o Ministério Público. (Redação dada pela Lei nº 9.807 , de 1999) )

Com relação as hipóteses não previstas em lei, há casos como o acréscimo do sobrenome do padrasto e os transexuais - pessoa que tem a forma de um sexo (masculino), mas a mentalidade de outro (feminino) - que após realizarem a cirurgia de mudança de sexo, alteram o nome no registro de nascimento.

Apesar do art. 13 do Código Civil ( Salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes ) vedar a disposição do próprio corpo, os juristas que participaram da I Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal em setembro de 2002 entenderam que "a expressão 'exigência médica', contida no art. 13, refere-se tanto ao bem-estar físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente" (Enunciado nº. 6).

Neste sentido, vejamos as seguintes decisões de recentes julgados dos Tribunais brasileiros:

DECISÃO: N J C, brasileiro, qualificado na inicial, formulou pedido de homologação de sentença estrangeira, proferida pelo Tribunal de Monza, República Italiana, que, em 19 de setembro de 2006, em razão de procedimento cirúrgico autorizado pela Justiça Italiana, determinou a retificação de seu registro civil, para a alteração da designação do gênero e de se prenome. O Ministério Público Federal, em parecer às fls. 23 -26, manifestou-se pelo deferimento do pedido. Passo a decidir. Inexiste óbice à presente homologação. Conforme assinalado por esta Corte na Sentença Estrangeira n. 2.149/IT, "a jurisprudência brasileira vem admitindo a retificação do registro civil de transexual, a fim de adaptar o assento de nascimento à situação decorrente da realização de cirurgia para mudança de sexo". (SE 004179 - Relator: Ministro Cesar Asfor Rocha - Data da Publicação: 15/04/2009) (Grifos nossos)

"REGISTRO CIVIL - Retificação - Assento de nascimento - Transexual - Alteração na indicação do sexo - Deferimento - Necessidade da cirurgia para a mudança de sexo reconhecida por acompanhamento médico multidisciplinar - Concordância do Estado com a cirurgia que não se compatibiliza com a manutenção do estado sexual originalmente inserto na certidão de nascimento - Negativa ao portador de disforia do gênero do direito à adequação do sexo morfológico e psicológico e a conseqüente redesignação do estado sexual e do prenome no assento de nascimento que acaba por afrontar a lei fundamental - Inexistência de interesse genérico de uma sociedade democrática em impedir a integração do transexual - Alteração que busca obter efetividade aos comandos previstos nos artigos1ºº , III , e3ºº , IV , daConstituição Federall - Recurso do Ministério Público negado, provido o do autor para o fim de acolher integralmente o pedido inicial, determinando a retificação de seu assento de nascimento não só no que diz respeito ao nome, mas também no que concerne ao sexo". (Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível n. 209.101-4 - Espirito Santo do Pinhal - 1ª Câmara de Direito Privado - Relator: Elliot Akel - 09.04.02 - V. U.)

No caso em tela, a Justiça Gaúcha mais uma vez deu um passo a frente ao deferir à um travesti a alteração do nome registral de masculino para feminino, mesmo sem ter realizado a cirurgia para troca de sexo, sob o fundamento de que a falta de sintonia entre o nome e a aparência impede a pessoa de viver com dignidade.

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