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27 de Abril de 2024
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    A questão do aborto no sistema interamericano de proteção aos direitos humanos

    há 16 anos

    Sem dúvida, um assunto bastante polêmico, que abriu espaço, no Brasil, à realização de audiências públicas, aguardando posicionamento final do STF.

    Trata-se de tema que divide a opinião pública e as autoridades. Atualmente tramitam no Congresso Nacional vários projetos de lei sobre o aborto, uns para aumentar a punição dessa conduta, hoje prevista como crime, e outros, para descriminalizá-la.

    No entanto, uma pergunta deve ser feita: é possível a legalização aborto no Brasil? Tal questionamento não deve ser respondido apenas com base no ordenamento jurídico interno, sendo indispensável também a análise dos instrumentos internacionais ratificados pelo Estado brasileiro.

    Nessa esteira, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, no seu artigo 4º dispõe que "1. Toda pessoa tem direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente".

    Da análise desse dispositivo surgem duas correntes. Para a primeira, muito embora o Pacto de San José determine que a proteção da vida se dê desde a concepção, o mais correto é entender que essa fica configurada a partir do nascimento. Afirmam que essa foi a intenção dos idealizadores da Convenção.

    De outro lado, para a maioria dos internacionalistas, deve-se observar o texto aprovado e que consta da Convenção, o que torna obrigatória, para os Estados-parte, a proteção da vida desde a concepção.

    O tema foi analisado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, no caso 2141, contra os Estados Unidos, quando se examinou uma situação de aborto autorizada pela Corte Suprema do Estado de Massachusetts. Trata-se do caso conhecido como "Baby Boy". Dessa análise foi extraída a Resolução 23 /81.

    Aqueles que defendem a descriminalização do aborto no Brasil utilizam como argumento exatamente essa resolução. Nada obstante, esse não é o melhor entendimento. O que se vê no seu relatório é exatamente o oposto: ela não autoriza o aborto.

    Ocorre que, como os Estados Unidos não é parte da Convenção Interamericana, os membros da Comissão não puderam impor-lhe o seu cumprimento, no sentido de atender a obrigação de preservar a vida desde a concepção. No caso em tela, não havia como fazer prevalecer as normas de direito internacional, predominando, assim, as regras internas de certos Estados americanos e seus tribunais que permitem as condutas abortivas.

    Totalmente diferente é a situação do Brasil: a República Federativa do Brasil é signatária do Pacto de San José e incorpora à sua legislação interna todos os acréscimos que se referem à proteção da vida, decorrentes desse instrumento internacional. Nessa esteira, tomando por base a corrente segundo a qual os tratados internacionais de direitos humanos integram o ordenamento jurídico interno com status de norma constitucional, o direito à proteção à vida, desde a concepção, deve ser compreendido como cláusula pétrea, de forma que tais projetos de lei que autorizam o aborto não poderiam nem mesmo estar em tramitação, já que eivados de inconstitucionalidade, conforme dispõe o artigo 60 , § 4º , da Constituição Federal .

    Este é o entendimento adotado pela maioria dos membros da Comissão Interamericana e que devemos extrair da Resolução 23 /81 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que, com base em tudo o que analisamos, inviabiliza as pretensões abortistas que atualmente tomam força no Brasil.

    Vale lembrar que atualmente no nosso Código Penal estão previstas duas hipóteses em que o aborto já é permitido no Brasil. Trata-se dos casos trazidos no artigo 128, do aludido diploma, conhecidos, respectivamente, como aborto necessário (quando há risco de vida para a gestante) e aborto humanitário ou sentimental (quando a gravidez resulta de estupro).

    Em tais situações não se cogita qualquer inconstitucionalidade ou ofensa ao Pacto de San José, haja vista que não há privação arbitrária da vida. O que a Convenção determina é que "ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente ".

    Nessa mesma linha de raciocínio está o aborto anencefálico (nos casos de anencefalia: feto sem cérebro), hipótese ainda não autorizada em lei, mas que também não deve ser considerada crime, em razão da ausência de tipicidade material, vez que não se verifica um resultado desvalioso, ou seja, a morte não é arbitrária ou desarrazoada.

    Diante de todo o exposto, devemos compreender que em relação ao tema aborto estamos diante de um conflito principiológico: direito à vida (do feto) e princípio da dignidade da pessoa humana (da mulher) e que há uma tênue linha divisória: quando realmente houver um motivo que justifique o aborto, como se dá, por exemplo, nas hipóteses explanadas (aborto necessário, humanitário e anencefálico) não há que se falar em violação ao Pacto de San José, pois não há privação arbitrária da vida. Em todos os demais casos, ficando evidenciada a arbitrariedade, a Convenção não permite o aborto.

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    Excelente artigo, parabéns. continuar lendo