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24 de Abril de 2024

Direito Penal do autor ou Direito Penal do fato?

há 15 anos

Como citar este artigo: ROBALDO, José Carlos de Oliveira. Direito Penal do autor ou Direito Penal do fato? Disponível em http://www.lfg.com.br. 28 julho. 2009.

Discute-se muito se o autor de uma conduta delituosa deve ser punido pelo que é (direito penal do autor), pelo que fez (direito penal do fato ou da culpa), pelos dois motivos concomitantemente ou, até mesmo, ora por um, ora por outro. Eis o tema.

É possível, a grosso modo, dividir o mundo em dois blocos: de um lado os países que adotam o direito penal do fato e, de outro, os países que adotam o direito penal do autor.

O sistema penal brasileiro, que é o que nos interessa diretamente nestas reduzidas reflexões, adotou, para caracterizar o crime, o direito penal do fato. Entretanto, para a fixação da pena, regime de cumprimento da pena, espécie de sanção, entre outros, adotou o direito penal do autor (CP, art. 59).

Isso significa que, no nosso caso, para responsabilizar penalmente alguém pela prática de uma conduta criminosa, impõe-se ao Estado, por meio do trabalho inicial, de regra, da polícia judiciária (inquérito policial) e do Ministério Público, deste em juízo (processo), provar, de forma induvidosa, a sua concorrência direta ou indiretamente para a prática da conduta que lhe foi imputada.

Nessa perspectiva não interessa o histórico ou antecedente do investigado ou suspeito. Por mais criminoso que seja o possível autor da infração, assim mesmo, para a sua condenação, impõe-se ao autor da ação penal, que, em regra, é o Ministério Público (estadual ou federal), obedecendo aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, por meios lícitos, provar cabalmente o seu envolvimento.

É nessa linha de raciocínio que se deve entender a afirmação técnica e bastante conhecida de que o que não está nos autos não está no mundo. Ou seja, mesmo que se tenha certeza de que A foi o autor da morte de C ou de que o caminhão carregado de maconha apreendido seja procedente da fronteira do Brasil com o Paraguai (Cel. Sapucaia, Ponta Porã), por pior que sejam os antecedentes dos possíveis autores, se essa certeza não vier para os autos do processo, a respectiva condenação não poderá ser concretizada.

Se de um lado isso é ruim porque passa à sociedade a sensação de impunidade, de outro, é positivo porque impede a injustiça. É igualmente dessa idéia que surgiu a afirmação popular de que mais vale um bandido solto do que um inocente preso, o que reforça, com efeito, o princípio de que a pessoa deve ser punida não pelo que é e sim pelo que fez.

A base jurídico-filosófica desse princípio está no Estado de Direito.

A partir da idéia do direito penal do fato é que se justifica a não punição nos chamados crimes impossíveis previstos nos nosso Código Penal, embora a tentativa tenha se verificado. Para exemplificar, vamos imaginar a hipótese em que um temeroso matador profissional seja contratado para matar A e, para executar com sucesso a tarefa, disparou sua arma contra a vítima no momento que dormia. Contudo, por meio de exame pericial, constatou-se que A já se encontrava morta por ocasião dos disparos. Neste caso, não obstante a intenção de matar e os antecedentes do matador profissional, ele não responderá pela morte porque não foi o autor do fato (morte). Poderá sim ser responsabilizado penalmente por porte ilegal de arma etc, mas não pela morte em si.

Agora, para a fixação da pena, espécie de pena, regime de cumprimento, substituição, transação penal etc, que é um momento posterior à imputação (responsabilização penal), aí sim, o nosso sistema penal adotou o chamado direito penal do autor, eis que nessas hipóteses o juiz levará em consideração, entre outras, o grau de culpabilidade (reprovabilidade) do autor do crime, seus antecedentes, as conseqüências do crime etc. Por exemplo, quem seqüestra alguém, mesmo que nos chamados seqüestros relâmpagos, e o mantém sob a mira da arma e com outros tipos de ameaças/violências até que o carro seja entregue no país vizinho ou que o dinheiro seja sacado do caixa eletrônico, necessariamente deve receber uma punição maior.

Disso se conclui que, para responsabilizar alguém pela prática de um crime, o sistema penal brasileiro leva em consideração o direito penal do fato, enquanto que para punir, aplicar a pena no caso concreto, tem como base o direito penal do autor.

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Exposição objetiva, clara e rica para o perfeito entendimento do leitor. Parabéns! continuar lendo

Fantástica explanação! Muitíssimo obrigada por contribuir para meu conhecimento jurídico! Deus te abençõe ricamente! continuar lendo

Simples e objetivo.
Parabéns. continuar lendo

excelente. continuar lendo