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23 de Abril de 2024

Patente constrangimento ilegal e a superação da súmula 691 pelo próprio STF

há 15 anos

LUIZ FLÁVIO GOMES ( www.blogdolfg.com.br )

Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP e Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Pesquisadoras: Patricia Donati.

Como citar este artigo: GOMES, Luiz Flávio. DONATI, Patricia. Patente constrangimento ilegal e a superação da súmula 691 pelo próprio STF. Disponível em http://www.lfg.com.br 29 junho. 2009.

O sujeito foi condenado em primeiro grau e a decisão foi confirmada pela segunda instância. Impetrou habeas corpus perante o STJ, que negou a medida liminar. Com base nessa negativa, a defesa impetrou novo HC perante o STF. Questionamentos:

1º) A confirmação, em segundo grau (recurso de apelação), da sentença condenatória, dá ensejo à execução provisória da pena?

De acordo com a jurisprudência assentada no STF, não. Toda prisão antes do trânsito em julgado da sentença condenatória apenas é cabível se presentes os pressupostos do art. 312 do CPP.

2º) A pendência de Recurso Especial (no STJ) ou Extraordinário (no STF) autoriza a execução provisória (imediata e automática) da pena imposta contra o réu?

Não. O mesmo raciocínio deve ser aplicado.

3º) Cabe HC ao STF contra decisão do STJ que denega liminar em outro HC? Em regra não. O regramento da matéria é feito pela súmula 691 do STF: "Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar (Conhecimento na Hipótese de Flagrante Constrangimento Ilegal - HC 85185 , HC 86864 MC- DJ de 16/12/2005 e HC 90746- DJ de 11/5/2007).

4º) Essa regra é absoluta?

Não. O próprio enunciado, em sua parte final, traz a exceção, ou seja, a hipótese em que a mesma pode ser relativizada: nos casos de flagrante constrangimento ilegal.

Decisão monocrática do Min. Gilmar Mendes: Em ordem a assegurar ao paciente o direito de permanecer em liberdade até o trânsito em julgado da condenação. Concessão da liminar. Súmula nº 691/STF:"não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar". A aplicação desse verbete tem sido abrandada em hipóteses excepcionais, a fim de evitar flagrante constrangimento ilegal ou em razão de manutenção de situação contrária ao entendimento do Supremo. A jurisprudência da Corte permite a superação da Súmula nº 691 quando constatada a deficiente fundamentação do ato atacado,"segundo efetivamente se verifica no caso concreto, ante a absoluta ausência de motivação ".

Comentários: a presente decisão traz em seu bojo a análise de dois temas realmente importantes: a impossibilidade de execução provisória da pena (salvo quando fundamentada) e a relativização da Súmula 691 do STF (quando patente o constrangimento ilegal).

Já tivemos a oportunidade de tratar desses temas separadamente, mas, no caso em comento, fica nítida a relação de causa e consequência. Ora, o afastamento da súmula 691 se deu em razão da caracterização do constrangimento ilegal, pela determinação da prisão do condenado antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem qualquer motivação.

Vejamos:

Execução provisória da pena: o STJ (com posicionamento legalista) por muito tempo admitiu a possibilidade de execução de pena provisória contra o réu. O fundamento utilizado: o fato de o RE e o REsp não possuírem efeito suspensivo. Esses recursos (por terem caráter extraordinário) não afastam a imediata expedição de eventual mandado de prisão. O art. 675 do CPP (que impede a expedição imediata de mandado de prisão) só tem aplicação quando se trata de recurso com efeito suspensivo. A prisão, como efeito da condenação, não viola a presunção de inocência.

No entanto, o STF, sob a perspectiva constitucional (à qual nos filiamos), vem afirmando constante e repetidamente (HC 71.644-MG , rel. Min. Celso de Mello; RTJ 195/603, rel. Min. Gilmar Mendes; HC 84.434-SP , rel. Min. Gilmar Mendes; HC 86.164-RO , rel. Min. Carlos Britto; RTJ 193/936) a imprescindibilidade de se demonstrar, em cada caso concreto, a necessidade de prisão cautelar, que possui caráter excepcional (RTJ 180/262-264, rel. Min. Celso de Mello).

De acordo com o entendimento constitucionalista da nossa Suprema Corte, a prisão, que toma por base exclusivamente"a lei"(que não confere efeito suspensivo ao RE ou ao REsp), se revela como uma afronta aos princípios assegurados no Estado constitucional e democrático de Direito (princípio da não culpabilidade). Trata-se, sem dúvida, de grande retrocesso que implica na execução provisória indevida da pena.

Súmula 691 do STF: o enunciado determina que o STF não possui competência para conhecer habeas corpus impetrado contra decisão de relator, ou de quem lhe faça as vezes, que em outro habeas corpus, ainda em andamento no Tribunal Superior, indeferiu o pedido liminar.

As razões que orientam a Súmula 691 estão no fato de que, se o STF examinar a controvérsia apresentada no novo HC, sem o julgamento definitivo do writ impetrado no STJ, haverá supressão de instância e, por conseqüência, ofensa aos princípios da hierarquia dos graus de jurisdição e da competência jurisdicional. No mesmo sentido consta os seguintes precedentes : HC 70648 , HC 76347 QO , HC 79238 , HC 79350 , HC 79748 , HC 80287, HC 80316 , HC 80631 , HC 80550 e HC 80081 .

Entretanto, também é entendimento do STF a possibilidade de atenuar o seu alcance. Em outras palavras, será admitido o HC contra indeferimento de liminar (em outro HC) nos casos em que houver flagrante ilegalidade. Como exemplo de superação do enunciado da Súmula 691 temos o emblemático HC 86.864/SP impetrado em favor de Flávio Maluf.

Desta feita, quando determinada a prisão do indivíduo, antes de transitada em julgado a sua sentença condenatória, sem fundamentação, patente o constrangimento ilegal, que permite a superação da súmula 691.

Partindo dessa premissa, o ministro Gilmar Mendes verificou que a decisao do TJ-SP não observou a regra do artigo 312, do Código de Processo Penal, uma vez que não fundamentou o decreto prisional, violando, também, o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Dessa forma, muito acertadamente deferiu o pedido de medida liminar a fim de assegurar ao acusado o direito de permanecer em liberdade até o trânsito em julgado da condenação, se por outro motivo não estiver preso.

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