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25 de Abril de 2024
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    Pensão militar é devida, inclusive, à mãe de criação

    há 15 anos

    Mãe de criação tem direito a pensão por morte de filho militar (Fonte: www.trf2.jus.br )

    Mãe de criação tem direito a receber pensão por morte de filho militar. Essa foi a conclusão de uma ação ordinária ajuizada na Justiça Federal do Rio de Janeiro por uma mulher que detinha a guarda de um aspirante a oficial do Exército, falecido aos 23 anos, em um acidente de carro. A primeira instância deu ganho de causa à mãe de criação do militar, determinando que ela fosse habilitada para receber a pensão. A sentença foi mantida pela Oitava Turma Especializada do TRF2, em julgamento de apelação apresentada pela União.

    O poder público federal alegou que ela, mesmo sendo viúva, não faria jus à habilitação porque não haveria prova de que fosse economicamente dependente do aspirante a oficial (a Lei 3.765 , de 1960, vigente quando o militar faleceu, estabelece que a pensão é concedida, pela ordem, à viúva, aos netos e à mãe viúva, solteira ou desquitada). A União também sustentou que a mãe de criação jamais teria regularizado a adoção de seu filho. Além disso, na documentação do falecido constariam os nomes dos pais biológicos e, portanto, teria sido mantido o vínculo com eles, para todos os efeitos legais.

    Segundo informações do processo, o militar foi abandonado recém-nascido, em dezembro de 1977, na porta da residência da autora da ação, em uma caixa de papelão. Dentro da caixa estava a certidão de nascimento da criança, com os nomes dos pais naturais, que nunca mais procuraram pelo filho. Em 1978, a mãe de criação conseguiu a guarda provisória da criança. Após o falecimento do militar, o pai biológico tentou se habilitar para receber a pensão. O pedido foi indeferido.

    A relatora do processo no TRF, a juíza federal convocada Maria Alice Paim Lyard, lembrou que o filho de criação era uma situação muito comum no Brasil das décadas de 1940 a 1970. Essa relação caracterizava-se pela integração total daquela pessoa estranha ao núcleo familiar, de tal forma que seria impossível, para qualquer pessoa, apontar uma distinção no tratamento dado a um filho natural e a um de criação. Nesse contexto, destacou a juíza, a falta de regularização da adoção se devia mais a um desconhecimento do que a qualquer outro motivo legal.

    A relatora da causa ponderou que, com isso, a mãe de criação deve ser equiparada à mãe adotiva e, portanto, o vínculo legal com os pais biológicos foi rompido. Maria Alice Paim Lyard, citando parecer do Ministério Público Federal, ressaltou que "admitir a esses pais qualquer direito de cunho patrimonial na atual conjuntura equivaleria em jogar por terra todo o esforço material e sentimental da apelante, que despendeu os esforços necessários para cuidar do falecido desde seus primeiros dias, para prestigiar a torpeza de seus pais biológicos, que somente agora, quando verificada a possibilidade de algum ganho material, resolveram aparecer e lembrar que tiveram um filho".

    Por fim, a juíza entendeu que não é preciso comprovar a dependência econômica, para que a mãe de criação faça jus ao beneficio, já que "a lei vigente à época defere a pensão à mãe viúva, caso da autora, sem fazer menção a necessidade de demonstração de dependência econômica".

    NOTAS DA REDAÇÃO

    Cezarina Monteiro da Silva, mãe de criação de Wellington Escobar Scursulim, aspirante a Oficial do Exército, ingressou com ação contra a União, com o intuito de receber a pensão militar.

    "Consta da inicial que, Wellington Escobar Scursulim, fora abandonado recém nascido, na porta da residência da autora, em uma caixa de papelão, em dezembro de 1977, com sua certidão de nascimento, constando como seus pais Raimundo Scursulim e Maria Amélia Escobar Scursulim, (Certidão de Nascimento, fls. 12).

    A autora, então, informou que requerera a guarda do recém nascido que lhe fora concedida, em caráter provisório, em 09/10/1978 (doc de fls. 13), ressaltando que os pais biológicos do falecido jamais o procuraram." (trecho do acórdão prolatado pela Oitava Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região).

    A Lei nº 3.765 , de 4 de maio de 1960, disciplina sobre as pensões militares, e, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, o direito à pensão de militar é regido pela data do evento morte.

    Dado o fato de que o aspirante a oficial militar faleceu em 2000, aplica-se a Lei nº 3.765 /60, cujo artigo disciplina a ordem de preferência para o recebimento da pensão militar, in verbis :

    Redação original

    Art 7º A pensão militar defere-se na seguinte ordem:

    I - à viúva;

    II - aos filhos de qualquer condição, exclusive os maiores do sexo masculino, que não sejam interditos ou inválidos;

    III - aos netos, órfãos de pai e mãe, nas condições estipuladas para os filhos;

    IV - à mãe viúva, solteira ou desquitada, e ao pai inválido ou interdito;

    V - às irmãs germanas e consangüíneas, solteiras, viúvas ou desquitadas, bem como aos irmãos menores mantidos pelo contribuinte, ou maiores interditos ou inválidos;

    VI - ao beneficiário instituído, desde que viva na dependência do militar e não seja do sexo masculino e maior de 21 (vinte e um) anos, salvo se fôr interdito ou inválido permanentemente. § 1º A viúva não terá direito à pensão militar se, por sentença passada em julgado, houver sido considerada cônjuge culpado, ou se, no desquite amigável ou litigioso, não lhe foi assegurada qualquer pensão ou amparo pelo marido. § 2º A invalidez do filho, neto, irmão, pai, bem como do beneficiário instituído comprovar-se-á em inspeção de saúde realizada por junta médica militar ou do Serviço Público Federal, e só dará direito à pensão quando não disponham de meios para prover a própria subsistência.

    Redação anterior à alteração dada pela Medida provisória nº 2215 -10, de 31.8.2001

    Art. 7º A Pensão Militar, é deferida em processo de habilitação, tomando-se por base a declaração de beneficiários preenchida em vida pelo contribuinte, na ordem de prioridades e condições a seguir: I - primeira ordem de prioridade - viúva ou viúvo; companheira ou companheiro; filhas solteiras e filhos menores de 21 anos ou, quando estudantes, menores de 24 anos; (Redação dada pela Lei nº 8.216 , de 1991)

    II - segunda ordem de prioridade - pais, ainda que adotivos que comprovem dependência econômica do contribuinte; (Redação dada pela Lei nº 8.216 , de 1991)

    III - terceira ordem de prioridade - a pessoa designada, mediante declaração escrita do contribuinte e que viva sob a dependência econômica deste, quando menor de vinte e um ou maior de sessenta anos. (Redação dada pela Lei nº 8.216 , de 1991)

    Parágrafo único. Os beneficiários de que trata este artigo, quando interditos ou inválidos, ou, ainda, acometidos de enfermidade grave, que os impeça de prover a própria subsistência, julgados por junta de saúde militar, poderão habilitar-se à pensão, independentemente dos limites de idade.

    Da leitura do artigo, a mãe viúva do de cujus somente teria direito à pensão no caso de comprovada a sua dependência econômica daquele.

    Contudo, a juíza federal convocada, Maria Alice Paim Lyard, ora relatora, entendeu que "Quanto à necessidade de comprovação de dependência econômica, a lei vigente à época defere a pensão à mãe viúva, caso da autora, sem fazer menção a necessidade de demonstração de dependência econômica" .

    Outra questão suscitada é o fato da autora nunca ter adotada o falecido. No parecer do Ministério Público Federal consta a explicação histórica que embasa o fato da autora nunca ter adotado o militar falecido e sim, tão-somente, sua guarda temporária:

    "O 'filho de criação' deve ser entendido tendo-se em conta a realidade social que reinava no Brasil nos ido das décadas de

    e 70, quando essa situação era muito comum. Normalmente o filho de criação se verificava entre os casais sem filhos, que acabavam criando até a vida adulta uma criança, normalmente órfã, de pai ou de mãe (e às vezes até mesmo de ambos), em virtude das dificuldades e especialmente dos preconceitos que o genitor biológico encontrava para cuidar do filho sozinho ou, quando ausentes os genitores, motivados pela compaixão humana; mas, qualquer que fosse a hipótese, movidos pelo carinho e sentimento de paternidade e maternidade que por algum motivo, ou não ocorreu naturalmente, ou se ocorrida, permita espaço para mais uma integração.

    De toda sorte, o que caracteriza essa situação de fato, por assim dizer, era a presença indiscutível da aura da maternidade, da espontaneidade de cuidar daquela pessoa estranha à relação familiar originária, integrando-a de tal forma, que seria, aos olhos de terceiros, impossível apontar qualquer distinção. Era uma situação que corresponderia à adoção, mas que acabava por não ser legalizada, mais por desconhecimento, do que por qualquer outra razão legal.

    Por esse motivo, diante da atual proteção constitucional à família, especialmente em razão do princípio de vedação ao retrocesso, não parece razoável negar à mãe de criação a pensão resultante da morte daquele que, se vivo fosse, a ajudaria, principalmente neste momento mais difícil da vida, que é a velhice, pela sincera relação de afeto que se estabeleceu.

    Deve-se destacar que, sobre a situação fática aqui apresentada, o Tribunal de Contas da União já se pronunciou, reconhecendo a equiparação da mãe de criação à mãe adotiva, tendo, inclusive, editado a Súmula nº 116 sobre o tema. Ressalte-se, ainda, que embora tenha sido recentemente revogada (Sessão Ordinária de 28/11/2007), tal entendimento não deve ser alterado, pois retrata a realidade fática de tempo atrás, quando, como dito, era comum uma pessoa criar um infante como filho, sem cuidar de proceder a adoção legal.

    É válido trazer o teor da referida Súmula nº 116 , do TCU: 'Ainda que não instituídas como beneficiárias, equipara-se a mãe de criação à mãe adotiva, bem como a filha de criação à filha adotiva, para feito de lhes ser assegurada a pensão militar prevista na Lei nº 3.765 , de 04/05/60, desde que comprovadas nos autos essas qualificações e não haja herdeiros prioritários'."

    Assim, embora a lei exigisse pais adotivos, é possível, no caso em debate, que a autora seja equiparada como tal, vez que a Constituição da República evoluiu no que tange à proteção da entidade familiar.

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