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26 de Abril de 2024
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    Prisão decorrente de pronúncia: revogação tácita

    há 14 anos

    LUIZ FLÁVIO GOMES (www.blogdolfg.com.br)

    Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP, Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG e Co-coordenador dos cursos de pós-graduação da Anhanguera-Uniderp. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Twitter: www.twitter.com/ProfessorLFG. Blog: www.blogdolfg.com.br - Pesquisadora: Áurea Maria Ferraz de Sousa.

    Como citar este artigo : GOMES, Luiz Flávio. Prisão decorrente de pronúncia: revogação tácita. Disponível em http://www.lfg.com.br - 14 de abril de 2010.

    Antes das reformas de 2008 (Leis 11.689/2008 e 11.719/2008) várias eram as prisões cautelares admitidas pelo nosso sistema processual: (a) prisão em flagrante; (b) prisão preventiva; (c) prisão temporária (Lei 7.960/89); (d) prisão decorrente de sentença condenatória recorrível; (e) prisão decorrente de pronúncia e (f) prisão decorrente de acórdão recorrível.

    Note-se que, por previsão expressa no Código de Processo Penal, falava-se em prisões decorrentes de sentença condenatória recorrível (art. 393, I) e da pronúncia (art. 585). De todas as elencadas sobraram três (depois da reforma do CPP): prisão em flagrante, prisão preventiva e prisão temporária.

    Após a reforma houve uma supervalorização dos pressupostos / requisitos concernentes à prisão preventiva para que se decrete ou se mantenha uma segregação cautelar. Ao artigo 387, do CPP, foi agregado, pela Lei 11.719/08, um parágrafo único, no qual se exige que o juiz decida sobre a manutenção ou recolhimento do réu (sob a modalidade de preventiva ou outra medida cautelar) de maneira fundamentada, sem prejuízo do conhecimento do recurso que venha a ser interposto. Com isso, restou tacitamente revogado o disposto no artigo 383, I, de acordo com o qual, era efeito da sentença condenatória recorrível a necessária conservação da prisão do réu preso. Da mesma forma, não há mais que se falar na legitimidade do conteúdo do artigo 585, do mesmo Código, que estipula a impossibilidade de o réu recorrer da pronúncia senão depois de preso, salvo se prestar fiança, nos casos em que a lei a admitir.

    Neste sentido foi a decisão da Primeira Turma da Suprema Corte que, ao julgar o Habeas Corpus 101.244-MG, assim expôs seus fundamentos no informativo 579:

    Prisão decorrente de Pronúncia e Art. 585 do CPP

    A Turma deferiu habeas corpus para expedir contramandado de prisão em favor de denunciado pela suposta prática do crime previsto no art. 121, 2º, III e IV, do CP que, não obstante tivesse respondido à ação penal em liberdade ante o excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal , tivera sua custódia decretada por ocasião da sentença de pronúncia. Asseverou-se que a segregação cautelar decorrente de pronúncia deve estar pautada em pelo menos um dos requisitos dispostos no art. 312 do CPP e que, no caso, o decreto prisional estaria lastreado apenas no fato de o paciente possuir maus antecedentes. Dessa forma, reputou-se inexistir qualquer elemento fático concreto apto a justificar a medida constritiva. Acrescentou-se que, com o advento da Lei 11.689/2008, tratando-se de réu solto, o juiz somente pode ordenar a sua prisão, quando inequivocamente presentes os já aludidos pressupostos do art. 312 do CPP, não mais subsistindo, para tanto, a análise isolada dos antecedentes do acusado (CPP, art. 413, ). (...) Por fim, concedeu-se a ordem, de ofício, para que seja recebido e processado o recurso em sentido estrito interposto pela defesa contra a pronúncia, cujo seguimento fora obstado, com base no art. 585 do CPP (O réu não poderá recorrer da pronúncia senão depois de preso, salvo se prestar fiança, nos casos em que a lei a admitir.), dado que o réu não teria se recolhido à prisão. Consignou-se que, com a reforma do CPP pela referida Lei 11.689/2008, o art. 585 do CPP encontrar-se-ia implicitamente revogado, uma vez que o réu somente deve se recolher ao cárcere se o magistrado assim entender necessário e desde que de modo motivado. HC 101244/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 16.3.2010. (HC-101244)

    Hoje os pressupostos da prisão preventiva se acham sumamente valorados. Porque não pode haver prisão cautelar sem motivo concreto (ou seja: ex vi legis). O juiz, ao decretar a prisão cautelar, deverá sempre fundamentar sua decisão num dos pressupostos que justificam a prisão preventiva: garantia da ordem pública ou da ordem econômica, conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.

    No caso em apreço a prisão tinha como fundamento apenas o fato de o réu possuir maus antecedentes, o que justificou a concessão da ordem no pedido de habeas corpus , determinando-se o processamento do recurso em sentido estrito interposto pela defesa.

    Outra questão que chama atenção no julgado: ao que parece o acusado já havia sofrido algum tipo de segregação cautelar, mas em face do excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal acabou respondendo à ação penal em liberdade.

    No sistema processual anterior, a doutrina e jurisprudência apontavam para um parâmetro de prazo para que se encerrasse a instrução processual, que era de 81 dias. Hoje, a ação penal deve ser concluída em, aproximadamente, 95 dias (avaliadas as condições do caso concreto), caso contrário, o acusado deve ser posto em liberdade, sob o argumento de excesso de prazo, a menos que novamente se verifique presente ao menos um dos pressupostos que autorizam a prisão preventiva. Isso porque o juiz tem a liberdade de revogar a prisão preventiva e novamente decretá-la quando reputar necessário (art. 316, CPP).

    Concluímos, dessa forma, que acertada foi a decisão proferida nos autos do HC em comento. Nenhuma prisão cautelar mais, no nosso país, pode fugir dos parâmetros fixados pelo art. 312 do CPP. De outro lado, ninguém pode ser ou ficar preso sem que demonstrada a absoluta necessidade dessa prisão.

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    Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes
    Notíciashá 13 anos

    O que se entende por prisão processual?

    Escola Brasileira de Direito, Professor
    Artigoshá 6 anos

    Quais são os requisitos para a decretação da prisão temporária?

    1 Comentário

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    Alguns autores sustentam não haver mais a possibilidade da prisão em flagrante como medida de natureza cautelar. Isto porque o atual artigo 310 do CPP determina ao juiz que ele tome uma das seguintes providências ao receber o auto de prisão em flagrante: relaxará a prisão em flagrante se ela for ilegal (inc.. I), convertê-la-á em prisão preventiva quando presentes os requisitos do artigo 312/313 do CPP e se se revelarem insuficiente as outras medidas cautelares diversas da prisão (inc. II) e concederá liberdade provisória, com ou sem fiança (inc. III) dado que o infrator não poderá permanecer preso provisoriamente, com antes ocorria, "em flagrante". Hoje, portanto, só restam duas prisões: a temporária e a preventiva. continuar lendo