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19 de Abril de 2024

STJ declara a impenhorabilidade da restituição do Imposto de Renda

há 14 anos

DECISAO (www.stj.jus.br)

Restituição de IR é impenhorável quando derivada de ganhos salariais

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que não é penhorável a restituição do Imposto de Renda (IR), desde que a parcela seja proveniente de remuneração mensal, de caráter alimentar. O condomínio ItaúPower Shopping, localizado em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte, recorreu ao STJ porque tentava receber uma dívida que iria ser paga por meio da penhora da restituição do IR do devedor.

O caso envolve um homem que foi executado pelo shopping. Foi determinada a penhora de R$ 1.393,57 de sua conta corrente referente à restituição de imposto de renda. O homem sustentou que o valor depositado fazia parte de seus rendimentos salariais e, por isso, não poderia ser penhorado. Ele pedia a desconstituição da penhora. Na primeira instância, o pedido foi negado, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) considerou procedente o pedido por entender que a quantia penhorada refere-se à restituição de IR proveniente de uma única fonte pagadora (empresa empregadora do devedor). Assim, o TJMG conclui que o valor seria de indiscutível natureza salarial e, portanto, seria impenhorável.

No STJ, o shopping alegou que, no momento em que o imposto é descontado da remuneração, deixa de ser verba salarial e passa a ter natureza tributária. Por isso, questiona essa impossibilidade de penhorar a quantia depositada na conta-corrente a título de restituição de imposto de renda retido na fonte.

Ao analisar o recurso, a relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que não é toda e qualquer parcela da restituição de imposto de renda que pode ser considerada como derivada de verba salarial ou remuneratória. O imposto de renda pode incidir, por exemplo, sobre recebimentos de aluguéis, lucro na venda de determinado bem, aplicações financeiras, entre outras possibilidades. E, nesses casos, não se pode falar em impenhorabilidade da restituição do tributo, já que não decorre de salário.

A ministra ressaltou ainda que a restituição do IR nada mais é do que a devolução do desconto indevidamente efetuado sobre o salário, após o ajuste do Fisco. Daí porque se pode dizer que a devolução do imposto de renda se trata de mera restituição de parcela do salário ou vencimento, fato que, por conseguinte, de maneira alguma desmerece o caráter alimentar dos valores a serem devolvidos, arrematou a relatora.

A ministra reconheceu que o lapso temporal entre a data do recebimento do salário e a restituição do valor indevidamente recolhido não tem o condão de modificar sua natureza, até porque esse prazo não decorre de vontade do contribuinte, mas sim de metodologia de cálculo da Receita Federal. Justamente em razão do caráter remuneratório-alimentar, a ministra concluiu pela impenhorabilidade dos valores a serem restituídos pelo Fisco. Por isso, o pedido do shopping foi negado. Por unanimidade, os outros integrantes da Terceira Turma seguiram o entendimento da relatora. (STJ, RESP 1150738, Min. Rel. NANCY ANDRIGHI - TERCEIRA TURMA, julgado em 20/05/2010)

NOTAS DA REDAÇAO

Antes de mais nada, é necessário compreender o que é imposto de renda. Valemo-nos então do art. 43 do CNT que fixa como imposto de renda aquele que incide sobre a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda ou de proventos de qualquer natureza, conforme o art. 43 do CTN, a saber:

Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

1o A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

2o Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

Assim, temos que no conceito de renda para fins de tributação enquadram-se todo acréscimo patrimonial fruto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos.

A luz do exarado pela ministra Relatora, tem-se que a questão em suma discute dois pontos centrais e que na verdade são a veia para a solução do caso em comento: (i) se o valor do Imposto de Renda retido mantém a natureza remuneratória e, portanto, alimentar, até a data de sua restituição; (ii) se o depósito de quantias referentes a salário, vencimentos, proventos ou soldo em conta corrente retira a natureza alimentar do valor depositado.

Fixado estes pontos, vejamos. É necessário compreender a natureza da restituição do IR.

Entende-se que a restituição do Imposto de Renda consiste na forma de se devolver ao contribuinte o que foi pago em excesso, se o valor devido for menor do que o já pago. Assim, retorna-se ao contribuinte, com base nos parâmetros que são apenas apurados após sua declaração por ajuste na Base de Cálculo do tributo pelo Fisco, mas que foram mensalmente deduzidas do assalariado, devido a obrigação imputado ao empregador, que deve reter o quantum repassando-o ao Fisco. Tem-se, portanto, que uma parcela do salário ou vencimento do contribuinte é direcionada ao pagamento do Imposto de Renda, já que este incide nas rendas auferidas no ano de exercício, e, anualmente, ao realizar a declaração, é que o contribuinte é cientificado se recolheu a menos ou a mais. E somente se o recolhimento for superior, é que fará jus à devolução dos valores recolhidos indevidamente.

Entendido o que de fato implica em restituição de imposto de renda, é possível concluir que na verdade o que se está devolvendo é salário. Ou seja, o empregado mês a mês pagou a mais o que era indevido, e o Fisco devolve a ele renda.

Daí o raciocínio do STJ no sentido de que se o valor depositado se refere a restituição de imposto de renda proveniente de trabalho assalariado, ou seja, valor de indiscutível natureza salarial é impenhorável, nos termos do artigo 649, IV, do código de processo civil, pois possui natureza alimentar.

Vejamos o artigo 649 do CPC (grifos nossos):

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis: I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;

II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no 3o deste artigo; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

VI - o seguro de vida; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006). VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006). IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).

X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006). XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político. (Incluído pela Lei nº 11.694, de 2008)

Extraímos do raciocínio que não é toda e qualquer parcela da restituição de Imposto de Renda que pode ser considerada como advinda de verba salarial ou remuneratória.

Se a restituição decorre de acréscimo patrimonial que não guarda qualquer relação com verbas outras que não as insertas no inciso IV do art. 649 do CPC, não há falar em impenhorabilidade. Por outro lado, quando a origem do valor devolvido se refere a receitas que gozam do privilégio da impenhorabilidade, nos termos do art. 649, IV, do CPC. deve-se analisar sua natureza, de modo a se discutir sobre a possibilidade ou não de penhora dos valores restituídos.

Importante notar que não é o lapso temporal existente entre a data de percepção da verba salarial e a restituição do valor indevidamente recolhido que tem o condão de modificar sua natureza. E isso porque o contribuinte depende do Fisco para ter a base de cálculo fixada, e constatar o que era devido ou não.

Também não é pelo simples fato de que houve o depósito em conta corrente que as referidas verbas perderiam sua natureza alimentar, já que é do costume atual o pagamento de verbas de natureza salarial por intermédio de conta corrente.

Portanto, as conjecturas apontadas no caso em comento, não poderiam de fato ter sido acolhida tão somente em pontos como lapso temporal, depósito em conta corrente, ou restituição de valores. O ponto crucial da decisão remonta á natureza cristalina do que fora depositado, para aí então discernir-se se a referida verba é impenhorável ou não.

Doutra sorte, vê-se que a ideia não é a de se incentivar o não adimplemento de obrigações contraídas, dificultando a execução por meio de penhora de valores em conta corrente, mas fixar-se quais valores se sujeitam a essa possibilidade, e quais restariam protegidos pela impenhorabilidade consoante sua própria natureza.

Daí o legislador determinar que ao que exceder a parcela alimentar de natureza salarial, ou em outras palavras, o que restar poupado em conta corrente para o mês subsequente, perde a natureza salarial passando a ser visto como penhorável, nos termos do art. 655, I do CPC. A finalidade da impenhorabilidade da importância de natureza salarial é permitir o mínimo indispensável ao suprimento das necessidades básicas do indivíduo, corolário do fundamento regente da CR/88, denominado princípio da dignidade humana.

Definida a razão da restituição da renda, se de natureza salarial/alimentar, ou se de acréscrimo patrimonial por motivos outros, necessário se torna averiguar se o valor restituído será alcançado pela tutela da impenhorabilidade.

Depositada a restituição do IR e sendo esta necessária ao suprimento da subsistência do devedor, é este valor protegido pela impenhorabilidade. Do contrário, excedendo ao necessário para a sobrevivência do devedor, perderá a natureza alimentar, e, portanto, poderá ser utilizada para a quitação dos débitos contraídos por ele.

Nessa esteira, vemos que a execução não pode ser instrumento para que o devedor tenha o mínimo necessário a sua subsistência retirado de sua esfera patrimonial, como restou demonstrado no caso em comento. Por outro lado a proteção legal que visa a proteção dessa parcela, não pode ser desculpa para que o devedor deixe de honrar suas obrigações.

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