INFORMATIVOS DO STF: Ao procedimento de apuração de ato infracional não se aplica o princípio da identidade física do juiz
Informativo STF, nº 610.
Brasília, 22 a 26 de novembro de 2010.
Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
SEGUNDA TURMA ECA: rito e princípio da identidade física do juiz
A 2ª Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pugnava pelo reconhecimento de nulidade da decisão que impusera a menor o cumprimento de medida sócio-educativa de semiliberdade, pela prática de ato infracional equiparado ao crime de roubo circunstanciado em concurso de agentes. A defesa alegava que, no rito em questão, não teria sido observado o disposto no art. 399, 2º, do CPP (Recebida a denúncia ou queixa, o juiz designará dia e hora para a audiência, ordenando a intimação do acusado, de seu defensor, do Ministério Público e, se for o caso, do querelante e do assistente. ... 2 O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença.). Sustentava, também, não haver fundamentação idônea para a aplicação da referida medida. Aduziu-se, inicialmente, que o princípio da identidade física do juiz não se aplicaria ao procedimento previsto no ECA, uma vez que esse diploma possuiria rito processual próprio e fracionado, diverso do procedimento comum determinado pelo CPP. A seguir, reputou-se que o recorrente teria cometido ato infracional caracterizado pela violência e grave ameaça à pessoa, de modo que estaria devidamente justificada a aplicação da medida sócio-educativa imposta. RHC 105198/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 23.11.2010. (RHC-105198)
NOTAS DA REDAÇAO
De acordo com a Constituição Federal de 1988, os menores de dezoito anos são penalmente inimputáveis, estando sujeitos às normas da legislação especial (art. 228). Isto significa que o adolescente não pratica crime. Atendendo a exigência constitucional, a Lei 8.069/90 Estatuto da Criança e do Adolescente regulamentou, dentre outros temas atinentes aos menores, a prática de atos infracionais. ECA
Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
Em retribuição à prática de ato infracional, o Estado responde com a imposição de medidas socioeducativas, de natureza jurídica impositiva, sancionatória e retributiva, cuja aplicação tem por objetivo inibir a reincidência. A medida socioeducativa é desenvolvida com finalidade pedagógico-educativa, sem contudo, perder o caráter impositivo que advém do fato de a medida ser aplicada independentemente da vontade do infrator. Tem, ainda, cunho sancionatório ao passo em que, diante da prática de um ato infracional, vislumbra-se a infringência de regra de convivência dirigida a todos de maneira impositiva pela lei. ECA
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
Dentre as medidas que restringem a liberdade do menor estão: a liberdade assistida, o regime de semiliberdade e a internação. A liberdade assistida , embora não seja privativa de liberdade como a semiliberdade e a internação, é medida sócio-educativa na qual o adolescente é acompanhado por uma equipe interdisciplinar de uma entidade de atendimento. De acordo com o ECA seu objetivo é auxiliar e orientar o menor infrator de modo a promove-lo socialmente bem como a sua família ( Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente ).
A semiliberdade é medida sócio-educativa, imposta ao adolescente infrator, privando parte sua liberdade; ela assemelha-se ao regime semiaberto de cumprimento de pena ( Art. 120. O regime de semi-liberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial ). A internação , por sua vez, é a medida sócio-educativa mais gravosa para o adolescente infrator, já que cerceia totalmente a sua liberdade. Exatamente por este motivo, o ECA prevê expressamente hipóteses nas quais poderá ser imposta (art. 122 - cometido medidante grave ameaça ou violência a pessoa; reiteração no cometimento de outras infrações; por descumprimento reiterado e injustificável de medida anterior).
No julgamento do RHC 105198/DF, a Segunda Turma do STF fixou dois entendimentos importantes atinentes ao tema procedimento relativo à prática de ato infracional. Vejamos:
Uma das teses da defesa era a nulidade da decisão recorrida que impôs ao menor medida sócio-educativa de semiliberdade pela prática de ato infracional equiparado ao crime do art. 157, 2º, II, do CP. O crime de roubo, como se sabe, é praticado por meio de violência ou grave ameaça contra pessoa, visando o patrimônio da vítima. O Código Penal o apena com reclusão de quatro a dez anos, aumentada de um terço até a metade se praticado em concurso de agentes. Veja-se, portanto, a gravidade do fato praticado pelo menor, o que justifica a medida adotada pelo juízo da infância e juventude que determinou o cumprimento da semiliberdade . Entendimento ratificado pelo Ministro Gilmar Mendes, no presente julgado.
A defesa também alegou que no procedimento em questão não teria sido observado o princípio da identidade física do juiz, previsto no Código de Processo Penal (art. 399, 2º: O juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença ). Para a Segunda Turma do Supremo, no entanto, não há que se falar em princípio da identidade física do juiz no procedimento previsto no ECA , uma vez que esse diploma possuiria rito processual próprio.
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