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8 de Maio de 2024

Da ordem de vocação hereditária no Código Civil de 2002 - Áurea Maria Ferraz de Sousa

há 13 anos

Direito das sucessões é o conjunto de regras e princípios que regulamentam a transmissão do patrimônio de alguém que faleceu aos seus sucessores. Nas lições de VENOSA, o direito das sucessões disciplina a projeção das situações jurídicas existentes, no momento da morte, da desaparição física da pessoa, a seus sucessores ( Direito civil: direito das sucessões . 10 ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 4).

A ordem de vocação hereditária, por sua vez, vem a ser a ordem sucessória, ou seja, o rol das pessoas que podem suceder.

No Código Civil de 1916, aberta a sucessão eram chamados a suceder os descendentes, os ascendentes, o cônjuge supérstite ou o companheiro, os colaterais até o quarto grau e, por último, a Fazenda Pública. Era um rol taxativo e preferencial, previsto no artigo 1.603, que assim dispunha:

Art. 1.603. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes ;

II - aos ascendentes ;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais;

V - aos Municípios, ao Distrito Federal ou à União.

De se notar que o cônjuge somente era beneficiado na ausência de descendentes ou ascendentes. Nesta época, ao cônjuge era dado o direito real de usufruto vidual (Art. 1.611, , CC/16: Ao cônjuge sobrevivente, casado sob regime de comunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único bem daquela natureza a inventariar ).

Com o advento do Novo Código Civil, em 2002, no entanto, os chamados a suceder são:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge ;

III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais.

A nova ordem de vocação hereditária, portanto, prevê a concorrência dos descendentes e dos ascendentes com o cônjuge, estabelecendo o seguinte: descendentes e cônjuge ou companheiro, ascendentes e cônjuge ou companheiro, cônjuge sozinho, colaterais até o quarto grau e companheiro e, por fim, o companheiro sozinho.

O NCC passa então a estabelecer as seguintes regras:

1. Na sucessão dos descendentes existem duas regras a serem observadas, quais sejam: a) a igualdade entre os descendentes (até 1988 o filho adotivo não herdava e o filho tido fora do casamento tinha direito à metade dos bem que os demais filhos herdavam), e b) o mais próximo sempre afasta o mais remoto.

Há, contudo, três hipóteses em que diferentes graus de descendência sucedem ao mesmo tempo: indignidade, deserdação e pré-morte.

2. Na sucessão dos ascendentes aplicam-se as mesmas regras acima mencionadas, acrescidas de uma terceira: a sucessão do ascendente é a única que se organiza em duas linhas, que são a paterna e a materna. No caso de herdarem um avô paterno e dois avôs maternos, o avô paterno receberá metade da herança, sendo a outra metade dividida entre os avôs maternos. Não havendo avô paterno, mas apenas dois avôs maternos estes recebem a totalidade da herança, ainda que haja bisavôs.

3. Na sucessão do cônjuge há que se observar que ele além de meeiro é também herdeiro, concorrendo nesta hipótese com descendentes e ascendentes. O cônjuge em verdade dispõe de meação, de herança (a depender do regime) e também de direito real de habitação (Art. 1.831, NCC: Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar ).

Vale dizer, que de acordo com o mesmo Código Civil, somente é reconhecido direito sucessório ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos; esta regra está prescrita no artigo 1.830.

Na sucessão do cônjuge há, ainda, algumas regras específicas. Vejamos.

Quando o cônjuge concorre com o descendente, esta sucessão depende do regime de bens adotado, sendo possível que não haja direito de sucessão do cônjuge em três hipóteses. São elas: a) adotado o regime da comunhão universal (o cônjuge não herda, pois tem direito à meação de tudo), b) adotado o regime da comunhão parcial de bens, sem a existência de bens particulares (o cônjuge também não herda, pois na prática há uma comunhão universal) e c) adotado o regime da separação obrigatória (quando o cônjuge sofre uma exclusão legal, logo também não pode herdar).

Deve ser frisado que a concorrência entre o cônjuge e os descendentes incide somente sobre os bens particulares, pois sobre os bens comuns o cônjuge já tem direito à meação. Nesta concorrência, no que diz respeito ao quinhão, o Código Civil impõe a observância da seguinte regra:

Art. 1.832. Em concorrência com os descendentes (art. 1.829, inciso I) caberá ao cônjuge quinhão igual ao dos que sucederem por cabeça, não podendo a sua quota ser inferior à quarta parte da herança, se for ascendente dos herdeiros com que concorrer.

Assim, se o cônjuge for ascendente de quem com ele concorre na sucessão fará jus a um quarto da herança. Na hipótese de concorrer, por exemplo, com apenas um filho terá direito à metade dos bem particulares do autor da herança, mas se concorrer com seis filhos comuns terá direito a um quarto da herança e os outros três quartos serão divididos entre os seis filhos.

Por outro lado, quando o cônjuge concorre com o ascendente a regra é a seguinte:

Art. 1.837. Concorrendo com ascendente em primeiro grau, ao cônjuge tocará um terço da herança; caber-lhe-á a metade desta se houver um só ascendente, ou se maior for aquele grau.

Na sucessão do cônjuge em concorrência com ascendentes independe a opção feita no regime de bens. Aqui qualquer que seja o regime adotado o cônjuge tem direito à meação e à herança.

4. Com relação à sucessão do companheiro há algumas regras específicas, já que este terá direito sucessório somente sobre os bens adquiridos a título oneroso na constância da união estável. O Código Civil dispôs da seguinte maneira sobre a sucessão do companheiro:

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: I - se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho; II - se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III - se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV - não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

Basicamente, é possível concluir-se que o Novo Código Civil estabeleceu que cônjuge e companheiro são herdeiros em concorrência com descendentes ou ascendentes, quebrando com a paridade entre cônjuge e companheiro, uma vez que prevê regras distintas. E, ainda, beneficiou o cônjuge e o companheiro em face dos ascendentes e descendentes, pois estes perderam pela subtração de parte da herança. Além disso, a Fazenda Pública deixou de ser herdeira.

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13 Comentários

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excelente artigo... muito simples e objetivo. Mas apesar disso, sabemos que na prática muita coisa, fica ao bel prazer da interpretação do juiz. O que infelizmente têm atrasado muito a vida dos jurisdicionados. Infelizmente a faculdade discricionária dos que detém o poder, tem feito do judiciário o universo complexo que é hoje em dia. (por favor, perdoem o meu tom de desabafo...) continuar lendo

Excelente texto! Lembro somente que tendo em vista a declaração de inconstitucionalidade do art. 1.790, CC, pelo STF (RE 646.721 e 878.694) o presente deve ser atualizado. continuar lendo

Bom dia! Achei o artigo muito explicativo e de fácil entendimento, para o meu caso que sou apenas "curiosa". Porém, uma dúvida que eu já tinha e não consegui sanar foi quanto aos direitos do cônjuge quando ele compete com os colaterais?! continuar lendo

o cônjuge não pode concorrer com os colaterais, pois existe uma ordem hereditária que o mesmo só pode concorrer primeiro com os descendentes, segundo com os ascendentes, terceiro o mesmo sucede a herança sozinho, e o quarto na falta dele é que entra os colaterais ate quarto graus que sucedem sozinhos sem o cônjuge, e por ultimo o município, o distrito federal ou a união a depender do caso concreto. conforme disciplina o ART. 1829 e o ART. 1844 do Código Civil Brasileiro. continuar lendo

´Caros senhores,

Gostei do conteúdo. É bastante esclarecedor. Creio que ficaria mais esclarecedor com o gráfico da grade sucessória.

Atenciosamente. continuar lendo