Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
19 de Abril de 2024

Quais medidas podem ser tomadas no procedimento de apuração de ato infracional?

há 15 anos

Resolução da Questão 73 - Versão 1 - Estatuto da Criança e do Adolescente

73. João, com dezesseis anos, teria furtado um relógio de Jairo, seu guardião, que denunciou o fato à polícia e ao Conselho Tutelar, expulsando João de casa. João respondeu procedimento de apuração de ato infracional, no qual pode o juiz, segundo dispõe expressamente o ECA ,

(A) aplicar a João medida de advertência, ainda que não haja prova suficiente de autoria.

(B) aplicar a João medida de abrigo em entidade cumulada com medida de prestação de serviços à comunidade.

(C) aplicar a João remissão como forma de exclusão do processo.

(D) aplicar a João medida sócio-educativa e a Jairo medida pertinente aos pais ou responsável.

(E) determinar a perda da guarda deferida a Jairo sobre João.

NOTAS DA REDAÇÃO

Antes de respondermos a questão, cabem algumas observações sobre o tema.

Conforme o artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente ato infracional é a conduta descrita como crime ou contravenção, praticada por criança ou adolescente.

À criança que comete um ato infracional, podem ser impostas, isolada ou cumulativamente, uma das medidas protetivas previstas no artigo 101 do ECA :

"I- encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;

V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII - abrigo em entidade; VIII - colocação em família substituta ."

Porém, no caso da questão, o ato infracional foi cometido por um adolescente. Nessa hipótese, será aplicada uma das medidas sócio-educativas previstas no artigo 112 do ECA :

"I- advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semi-liberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional;

VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI ."

A competência para aplicar as medidas protetivas, salvo a colocação em família substituta, é do Conselho Tutelar, enquanto que a competência para aplicar as medidas sócio-educativas é do Juízo da Infância e Juventude.

A alternativa correta é a letra A. Vejamos.

(A) aplicar a João medida de advertência, ainda que não haja prova suficiente de autoria.

Correto.

A advertência, prevista no artigo 115 do ECA , é a mera admoestação verbal, que será reduzida a termo e assinada pelo infrator, seus pais, ou responsável.

Conforme Moraes e Ramos (A prática de ato infracional in Curso da Criança e do Adolescente. 3ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008, pág. 791) a advertência é, na prática, aplicada em casos de atos infracionais de natureza leve cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, bem como na hipótese de ser a primeira vez que o adolescente praticou um ato infracional.

Dispõe o ECA , em seu artigo 114 , parágrafo único , que a aplicação da advertência prescinde da prova suficiente de autoria, bastando apenas indícios suficientes de autoria e prova da materialidade.

"Art. 114, parágrafo único. A advertência poderá ser aplicada sempre que houver prova da materialidade e indícios suficientes da autoria."

Observe-se, no entanto, que em relação às demais medidas sócio-educativas é imprescindível a prova suficiente de autoria bem como da materialidade da infração, conforme artigo 114 , caput, do ECA :

"Art. 114. A imposição das medidas previstas nos incisos II a VI do art. 112 pressupõe a existência de provas suficientes da autoria e da materialidade da infração, ressalvada a hipótese de remissão, nos termos do art. 127."

(B) aplicar a João medida de abrigo em entidade cumulada com medida de prestação de serviços à comunidade.

A colocação em abrigo é uma medida protetiva, cuja característica é a excepcionalidade e provisoriedade.

Ao contrário das medidas sócio educativas previstas nos incisos I a VI do artigo 101 do ECA , a colocação em abrigo (assim como a colocação em família substituta) nunca será imposta como medida sócio-educativa pela prática de ato infracional, pois seu caráter é "exclusivamente protetivo". (MORAES, Bianca Mota de; RAMOS, Helane Vieira. A prática de ato infracional in Curso da Criança e do Adolescente. 3ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008, pág. 784.)

As medidas protetivas podem ser cumuladas umas com as outras, bem como podem ser cumuladas entre si as medidas sócio educativas, conforme previsão expressa do artigo 99 e 113 do Estatuto da Criança e do Adolescente :

"Art. 99. As medidas previstas neste Capítulo poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo.

Art. 113. Aplica-se a este Capítulo o disposto nos arts. 99 e 100 ."

No entanto, o ECA não prevê a possibilidade de cumulação de um medida protetiva com uma medida sócio-educativa, e, portanto, essa alternativa não deve ser assinalada como correta.

(C) aplicar a João remissão como forma de exclusão do processo.

Esta alternativa está incorreta.

A concessão da remissão como forma de exclusão do processo é de atribuição do membro do Ministério Público, e não do Juiz, a quem cabe conceder a remissão como forma de suspensão ou extinção do processo.

É o que dispõe o artigo 126 do Estatuto da Criança e Adolescente:

"Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do Ministério Público poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e conseqüências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional. Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo."

(D) aplicar a João medida sócio-educativa e a Jairo medida pertinente aos pais ou responsável.

A alternativa está parcialmente incorreta.

De fato, cabe ao juiz aplicar a João a medida sócio-educativa adequada ao adolescente infrator.

No entanto, a segunda parte da alternativa está incorreta.

Isto porque as medidas pertinentes aos pais ou responsáveis têm o objetivo de garantir a eficácia das medidas protetivas (artigo 101) aplicadas à criança ou adolescente.

Nesse sentido: "O estudo do dispositivo legal em comento [artigo 129] faz perceber que à medida de proteção prevista em favor de determinada criança ou adolescente, corresponde, em regra, alguma medida aplicável a seus pais ou responsável." (TAVARES, Patrícia Silveira. As medidas pertinentes aos pais ou responsáveis, in Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 3ª edição. Rio de Janeiro: São Paulo, 2008, pág. 500).

As medidas aplicáveis aos pais ou responsável estão previstas no artigo 129 do ECA , e são as seguintes:

"I - encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família;

II - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

III - encaminhamento a tratamento psicológico ou psiquiátrico;

IV - encaminhamento a cursos ou programas de orientação;

V - obrigação de matricular o filho ou pupilo e acompanhar sua freqüência e aproveitamento escolar;

VI - obrigação de encaminhar a criança ou adolescente a tratamento especializado;

VII - advertência;

VIII - perda da guarda;

IX - destituição da tutela;

X - suspensão ou destituição do pátrio poder.

Parágrafo único. Na aplicação das medidas previstas nos incisos IX e X deste artigo, observar-se-á o disposto nos arts. 23 e 24.

Art. 130. Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum."

As medidas pertinentes aos pais ou responsáveis tem por escopo"funcionar como estrutura de retaguarda para as medidas de proteção indicadas no artigo 101 do ECA , uma vez que a criança e o adolescente não podem ser vistos isoladamente, e, sim, como integrantes de contexto sociofamiliar que, certamente, exerce grande influência em sua vida " (TAVARES, Patrícia Silveira. O Conselho Tutelar, in Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 3ª edição. Rio de Janeiro: São Paulo, 2008, pág. 356).

Ademais, a competência para aplicar tais medidas aos pais ou responsáveis é do Conselho Tutelar (e não do juiz, como disposto na questão), salvo nas hipóteses de perda da guarda, destituição da tutela e suspensão ou destituição do pátrio poder, cuja competência é do Juiz.

"Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:

(...)

II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII; "

(E) determinar a perda da guarda deferida a Jairo sobre João.

Esta alternativa está incorreta.

A perda da guarda é uma das medidas pertinentes aos pais ou responsáveis ("Art. 129. São medidas aplicáveis aos pais ou responsável: (...) VIII - perda da guarda; "), e será determinada pelo juiz quando o guardião descumprir um dos deveres decorrentes da guarda.

Poder-se-ia dizer, que, no caso concreto, o fato de o guardião ter expulsado de casa o adolescente caracterizaria hipótese de abandono material, e, assim, estaria caracterizado o descumprimento de um dos deveres da guarda ("Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais .")

Na hipótese acima descrita, a perda da guarda poderia ser decretada pelo juiz, sendo, porém, imprescindível a instauração de um processo específico para tal (ou nos mesmo autos do procedimento da guarda), observando-se o devido processo legal.

"Art. 169. Nas hipóteses em que a destituição da tutela, a perda ou a suspensão do pátrio poder constituir pressuposto lógico da medida principal de colocação em família substituta, será observado o procedimento contraditório previsto nas Seções II e III deste Capítulo. [ 1 ]

Parágrafo único. A perda ou a modificação da guarda poderá ser decretada nos mesmos autos do procedimento, observado o disposto no art. 35."[ 2 ]

Portanto, não pode a perda da guarda ser decretada pelo juiz no curso do processo em que se apurou a prática do ato infracional, razão pela qual essa alternativa está incorreta.

1. Seção I

Disposições Gerais

Art. 152. Aos procedimentos regulados nesta Lei aplicam-se subsidiariamente as normas gerais previstas na legislação processual pertinente.

Art. 153. Se a medida judicial a ser adotada não corresponder a procedimento previsto nesta ou em outra lei, a autoridade judiciária poderá investigar os fatos e ordenar de ofício as providências necessárias, ouvido o Ministério Público.

Art. 154. Aplica-se às multas o disposto no art. 214.

Seção II

Da Perda e da Suspensão do Pátrio Poder

Art. 155. O procedimento para a perda ou a suspensão do pátrio poder terá início por provocação do Ministério Público ou de quem tenha legítimo interesse.

Art. 156. A petição inicial indicará:

I - a autoridade judiciária a que for dirigida;

II - o nome, o estado civil, a profissão e a residência do requerente e do requerido, dispensada a qualificação em se tratando de pedido formulado por representante do Ministério Público;

III - a exposição sumária do fato e o pedido;

IV - as provas que serão produzidas, oferecendo, desde logo, o rol de testemunhas e documentos.

Art. 157. Havendo motivo grave, poderá a autoridade judiciária, ouvido o Ministério Público, decretar a suspensão do pátrio poder, liminar ou incidentalmente, até o julgamento definitivo da causa, ficando a criança ou adolescente confiado a pessoa idônea, mediante termo de responsabilidade.

Art. 158. O requerido será citado para, no prazo de dez dias, oferecer resposta escrita, indicando as provas a serem produzidas e oferecendo desde logo o rol de testemunhas e documentos.

Parágrafo único. Deverão ser esgotados todos os meios para a citação pessoal.

Art. 159. Se o requerido não tiver possibilidade de constituir advogado, sem prejuízo do próprio sustento e de sua família, poderá requerer, em cartório, que lhe seja nomeado dativo, ao qual incumbirá a apresentação de resposta, contando-se o prazo a partir da intimação do despacho de nomeação.

Art. 160. Sendo necessário, a autoridade judiciária requisitará de qualquer repartição ou órgão público a apresentação de documento que interesse à causa, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público.

Art. 161. Não sendo contestado o pedido, a autoridade judiciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por cinco dias, salvo quando este for o requerente, decidindo em igual prazo.

§ 1º Havendo necessidade, a autoridade judiciária poderá determinar a realização de estudo social ou perícia por equipe interprofissional, bem como a oitiva de testemunhas.

§ 2º Se o pedido importar em modificação de guarda, será obrigatória, desde que possível e razoável, a oitiva da criança ou adolescente.

Art. 162. Apresentada a resposta, a autoridade judiciária dará vista dos autos ao Ministério Público, por cinco dias, salvo quando este for o requerente, designando, desde logo, audiência de instrução e julgamento. § 1º A requerimento de qualquer das partes, do Ministério Público, ou de ofício, a autoridade judiciária poderá determinar a realização de estudo social ou, se possível, de perícia por equipe interprofissional. § 2º Na audiência, presentes as partes e o Ministério Público, serão ouvidas as testemunhas, colhendo-se oralmente o parecer técnico, salvo quando apresentado por escrito, manifestando-se sucessivamente o requerente, o requerido e o Ministério Público, pelo tempo de vinte minutos cada um, prorrogável por mais dez. A decisão será proferida na audiência, podendo a autoridade judiciária, excepcionalmente, designar data para sua leitura no prazo máximo de cinco dias.

Art. 163. A sentença que decretar a perda ou a suspensão do pátrio poder será averbada à margem do registro de nascimento da criança ou adolescente.

2. Art. 35. A guarda poderá ser revogada a qualquer tempo, mediante ato judicial fundamentado, ouvido o Ministério Público.

  • Sobre o autorTradição em cursos para OAB, concursos e atualização e prática profissional
  • Publicações15364
  • Seguidores876189
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações9806
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/quais-medidas-podem-ser-tomadas-no-procedimento-de-apuracao-de-ato-infracional/555854

Informações relacionadas

Jurisprudênciahá 4 anos

Tribunal de Justiça da Paraíba TJ-PB: XXXXX-77.2019.8.15.0000 PB

Leidyane Gomes , Advogado
Modeloshá 6 anos

[Modelo] Embargos de declaração (omissão)

Fabricio Marinho, Advogado
Modeloshá 4 anos

Danos Morais Cancelamento Indevido de Conta Bancária

Bruno Schnell, Estudante de Direito
Artigoshá 7 anos

O Instituto da Advertência no Estatuto da Criança e Adolescente

Artigoshá 8 anos

As Medidas de Proteção para a criança e o Adolescente

0 Comentários

Faça um comentário construtivo para esse documento.

Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)