Em sede de reclamação constitucional, STF concede liberdade provisória a acusado por porte ilegal de arma
Rcl/6236 - RECLAMAÇÃO
Procedência: SÃO PAULO
Relator: MIN. EROS GRAU
Partes RECLTE.(S) - LUIZ ROBERTO ROCHA
ADV.(A/S) - JOSÉ RICARDO GOMES
RECLDO.(A/S) - JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PEREIRA BARRETO (PROCESSO Nº 192/2008)
INTDO.(A/S) - MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO Matéria: DIREITO PROCESSUAL PENAL | prisão em flagrante
DIREITO PENAL | Crimes Previstos na Legislação Extravagante | Crimes do Sistema Nacional de Armas
NOTAS DA REDAÇÃO
Trata-se da Reclamação de nº. 6236, interposta perante o STF em razão do descumprimento da decisão proferida pela Corte na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) nº. 3112, na qual fora declarada a inconstitucionalidade de três dispositivos do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826 /03), dentre os quais, o artigo 21, que proibia a concessão de liberdade provisória aos acusados pelos crimes ali previstos.
De acordo com o entendimento firmado pelo STF no julgamento da ação supracitada, o dispositivo em comento violava os princípios da presunção de inocência e do devido processo legal, no que se refere à ampla defesa e ao contraditório.
O instituto da liberdade provisória possui previsão expressa na própria Constituição Federal , que, em seu artigo 5º , LXVI dispõe "ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança".
Nesses mesmos termos, o CPP (Código de Processo Penal), em seu artigo 310 estabelece, in verbis
Art. 310 - Quando o juiz verificar pelo auto de prisão em flagrante que o agente praticou o fato, nas condições do art. 19 , I , II e III , do Código Penal , poderá, depois de ouvir o Ministério Público, conceder ao réu liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos do processo, sob pena de revogação. Parágrafo único - Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva (arts. 311 e 312).
A doutrina define a liberdade provisória como uma contracautela proposta em relação à prisão. Trata-se de medida cautelar por meio da qual se busca colocar fim, ainda que provisoriamente, ao encarceramento. Fala-se em liberdade sob condições, e, por isso, é provisória.
Note-se que a liberdade provisória somente é cabível em sede de prisão em flagrante, não se cogitando da sua incidência quando se tratar de prisão preventiva ou temporária, que somente admitem a revogação.
Nesse momento, uma importante observação se impõe. Quando da prisão em flagrante, é possível destacar duas situações distintas. No caso de vício do flagrante (ilegalidade), o instituto a ser utilizado é o relaxamento. Em todas as demais situações, abre-se espaço para a liberdade provisória, desde que preenchidos os seus requisitos legais.
Atualmente, no Brasil, contamos apenas com duas espécies de liberdade provisória: a) sem fiança; b) com fiança. O ordenamento jurídico pátrio não mais admite a chamada liberdade provisória fidejussória, na qual outra pessoa se responsabilizava pelo preso, sob termo de compromisso.
Analisemos os dispositivos que cuidam do tema.
Art. 310 - analisado anteriormente
O artigo 321 do CPP traz os requisitos da liberdade provisória sem fiança.
A rt. 321. Ressalvado o disposto no art. 323, III e IV, o réu livrar-se-á solto, independentemente de fiança: I - no caso de infração, a que não for, isolada, cumulativa ou alternativamente, cominada pena privativa de liberdade; II - quando o máximo da pena privativa de liberdade, isolada, cumulativa ou alternativamente cominada, não exceder a três meses .
Esse dispositivo cuida da liberdade provisória obrigatória ou desvinculada, que independe do pagamento de fiança. Destacam-se seis possibilidades: a) infração a que não cominada pena privativa de liberdade, seja cumulada ou isoladamente; b) quando pena privativa de liberdade não superior a 3 meses; c) crime praticado sob a égide de excludente de ilicitude; d) ausência de motivos que autorizariam a decretação de prisão preventiva; e) no caso de pronúncia ou sentença condenatória recorrível em que o réu é primário, com bons antecedentes.
Nesses casos, como não haverá o pagamento de fiança, a liberdade provisória somente pode ser concedida depois da oitiva do Ministério Público.
A liberdade provisória com fiança está regulamentada nos artigos 327 e 328 do CPP .
Art. 327. A fiança tomada por termo obrigará o afiançado a comparecer perante a autoridade, todas as vezes que for intimado para atos do inquérito e da instrução criminal e para o julgamento. Quando o réu não comparecer, a fiança será havida como quebrada.
Art. 328. O réu afiançado não poderá, sob pena de quebramento da fiança, mudar de residência, sem prévia permissão da autoridade processante, ou ausentar-se por mais de 8 (oito) dias de sua residência, sem comunicar àquela autoridade o lugar onde será encontrado.
Em tais situações, como o réu fica vinculado ao processo, a liberdade provisória pode ser concedida independentemente da oitiva do órgão ministerial.
No caso em comento, o crime imputado ao acusado está previsto na Lei 10.826 /03 - Estatuto do Desarmamento . Ao analisar os crimes ali descritos, é possível notar que a todos se impõe pena privativa de liberdade (reclusão), e, que as penas a eles cominadas são superiores a três meses, o que, de início, impossibilita a concessão da liberdade provisória sem fiança, salvo se a infração penal tiver sido praticada sob excludente de ilicitude ou quando não presentes os motivos ensejadores da prisão preventiva.
Como não tivemos acesso aos autos, não é possível afirmar qual a modalidade de liberdade provisória concedida ao acusado, se, com ou sem fiança. O que mais importa, no entanto, é o reconhecimento e a confirmação, pela nossa Suprema Corte, desse direito, que se coaduna aos valores consagrados por um Estado Constitucional de Direito como o Brasil.
Veja a decisãoproferida naADI 3112 na íntegra. Clique aqui
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