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26 de Abril de 2024

Sexta Turma do STJ decide: concubina não tem direito a dividir pensão com esposa

há 15 anos

DECISÃO

Sexta Turma define que concubina não tem direito a dividir pensão com esposa

O Superior Tribunal de Justiça negou a uma concubina o direito ao recebimento de pensão por morte de segurado legalmente casado. Por maioria, a Sexta Turma do STJ reformou acórdão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região que entendeu que a pensão deveria ser rateada entre a viúva e a concubina, diante da demonstrada dependência econômica da companheira.

O acórdão do TRF entendeu que o estado civil de casado do segurado não impedia a concessão do benefício à concubina em conjunto com a esposa, já que ficou comprovada a existência de união estável e a relação de dependência econômica. Sustentou, ainda, que, embora desconhecida pela esposa, filhos e parentes próximos do segurado, a relação amorosa com ele durou 28 anos e era notória na localidade em que a concubina residia, o que caracteriza uma união estável.

A esposa do segurado recorreu ao STJ alegando que não há como se conferir status de união estável a uma aventura extraconjugal que não configura entidade familiar. Também argumentou que, ao reconhecer a relação estável entre um homem e duas mulheres e permitir a divisão equânime do beneficio, o TRF violou vários dispositivos legais.

O relator do processo, ministro Nilson Naves, negou provimento ao recurso da esposa por entender que o acórdão protegeu a boa-fé de uma relação concubinária de quase 30 anos. Em voto vista que abriu a divergência, o ministro Hamilton Carvalhido acolheu o recurso para reformar o acórdão recorrido.

Citando vários dispositivos de diversas leis, Hamilton Carvalhido ressaltou que, mesmo diante da evolução legislativa, o legislador manteve como exigência para o reconhecimento da união estável que segurado e companheira sejam solteiros, separados de fato ou judicialmente ou viúvos que convivam como entidade familiar, ainda que não sob o mesmo teto, excluindo-se, para fins de reconhecimento de união estável, as situações de simultaneidade de relação marital e de concubinato.

"Assim, o reconhecimento impuro, concubinagem ou concubinato adulterino, simultâneo à relação de casamento, mantém-se à margem da legislação previdenciária", ressaltou em seu voto. Para ele, mesmo com a vigência de uma nova visão de valores em matéria familiar, o instituto da união estável efetiva importante distinção entre relações livres e relações adulterinas.

Segundo Hamilton Carvalhido, a jurisprudência reconhece à companheira de homem casado, desde que separado de fato ou de direito, divorciado ou viúvo, o direito na participação dos benefícios previdenciário e patrimoniais decorrentes do seu falecimento, concorrendo com a esposa ou até mesmo excluindo-a da participação. "De sorte, que a distinção entre concubinato e união estável hoje não oferece mais dúvida", destacou.

Para o ministro, mesmo diante da incontroversa relação oculta de 28 anos entre a concubina e o segurado e do casamento estável de 30 anos com a esposa, a verdade é que se trata de situação extravagante à previsão legal. Também em voto vista, a ministra Maria Thereza de Assis Moura votou pelo provimento do recurso.

O julgamento foi concluído com o voto desempate do ministro Paulo Gallotti, que acompanhou a divergência aberta pelo ministro Hamilton Carvalhido. Ficaram vencidos o ministro Nilson Naves e o desembargador convocado Carlos Mathias.

NOTAS DA REDAÇÃO

A Sexta Turma do STJ reiterou seu entendimento, e por maioria de votos reformou o acórdão do TRF da 5ª Região, negando a concubina o direito ao recebimento de pensão por morte de segurado legalmente casado.

O entendimento do TRF da 5ª Região é de que a pensão deveria ser rateada entre a viúva e a concubina, diante da demonstrada dependência econômica da companheira, e de comprovação da união desta com o segurado casado durante 28 anos.

Mesmo diante da evolução legislativa, manteve-se como exigência para o reconhecimento da união estável que segurado e companheira sejam solteiros, separados de fato ou judicialmente ou viúvos que convivam como entidade familiar, ainda que não sob o mesmo teto, excluindo-se, para fins de reconhecimento de união estável, as situações de simultaneidade de relação marital e de concubinato. "Assim, o reconhecimento impuro, concubinagem ou concubinato adulterino, simultâneo à relação de casamento, mantém-se à margem da legislação previdenciária ".

Nos dizeres de Flávio Tartuce e José Fernando Simão (Direito Civil, v. 5 : Família. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método,2008), "é imperioso verificar que há uma tendência de ampliar o conceito de família para outras situações não tratados especificamente pelo Texto Maior ", nesta mesma linha de pensamento a Desembargadora do TJRS, Maria Berenice Dias, fala em Famílias Plurais:"O novo modelo de família funda-se sob os pilares da repersonalização, da afetivida, da pluralidade e do eudomonismo, impingindo uma nova roupagem axiológica ao direito de família (...) ". Ela traz as seguintes modalidades de entidades familiares:

a) Família matrimonial: decorrente do casamento.

b) Família informal: decorrenta da união estável.

c) Família homoafetiva: decorrente da união de pessoas do mesmo sexo.

d) Família monoparental: constituída pelo vínculo existente entre um dos genitores com seus filhos, no âmbito de especial proteção do Estado.

e) Família anaparental: decorrente "da convivência entre parentes ou entre pessoas, ainda que não parentes, dentro de uma estruturação com identidade e propósito".

f) Família eudemonista: conceito utilizado para identificar a família pelo vínculo afetivo.

Apesar da decisão tomada pela 6ª Turma do STJ representar entendimento predominante, o Min. Fontes Alencar, da 4ª Turma, no julgamento do Resp 57.606/MG , reconhece que o imóvel em que residem duas irmãs é bem de família, pois ambas constituem entidade familiar. Portanto, reconhece como entidade familiar algo que não se enquadra no conceito de família contido no art. 226 da CF/88 . Pode-se dizer, que o rol do art. 226 seria meramente exemplificativo e não taxativo.

O atual Código Civil traz expressamente a diferença entre união estável e concubinato: CC , Art. 1.723 . "É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

§ 1o A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente". CC , Art. 1.727 . "As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato".

Ao concubinato se aplica o disposto na Súmula 380 do STF, por trata-se de sociedade de fato e não de entidade familiar:

STF, Súmula 380 : "Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum".

Mais uma vez concordamos com o posicionamento de Maria Berenice Dias, que diz: "Situações de fato existem que justificam considerar que alguém possua duas famílias constituídas. São relações de afeto, apesar de consideradas adulterinas, e podem gerar conseqüências jurídicas ".

No RE 397.762 -8/BA, j. 03.06.2008, o STF abordou a questão de um sujeito que tinha duas uniões concomitantes em que ambas, a esposa e a "companheira", requeriam pensão previdenciária do falecido. No caso em julgamento, o falecido nunca se separou de fato da esposa, portanto, era casado de fato e de direito, tendo com ela 11 filhos; mas mantinha relação duradoura de 37 anos com outra mulher da qual nasceram 9 filhos. Diante destes fatos, o Ministro Carlos Ayres Brito assim conclui:

"12. Minha resposta é afirmativa para todas as perguntas. Francamente afirmativa, acrescento, porque a união estável se define por exclusão do casamento civil e da formação da família monoparental. É o que sobra dessa duas formatações, de modo a constituir uma terceira via: o tertium genus do companheirismo , abarcante assim dos casais desempedidos para o casamento civil, ou, reversamente, ainda sem condições jurídicas para tanto. Daí ela própria, Constituição , falar explicitamente de 'conjuge ou companheiro' no inciso V do art. 201 , a propósito do direito a pensão por porte de segurado da previdência social geral. 'Companheiro' como situação jurídica ativa de quem mantinha com o segurado falecido um relação doméstica de franca estabilidadev ('união estável'). Sem essa palavra azeda, feia, discriminadora, preconceituosa, do concubinato. Estou a dizer: não há concubinos para a Lei Mais Alta do nosso País, porém casais em situação de companheirismo. Até porque o concubinato implicaria discriminar os eventuais filhos do casal, que passariam a ser rotulados de 'filhos concubinários'. Designação pejorativa, essa, incontornávelmente agressora do enunciado constituicional de que 'Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação' (§ 6º do art. 227, negritos à parte). 13. Com efeito, à luz do Direito Constitucional brasileiro o que importa é a formação em si de um novo e duradouro doméstico. A concreta disposição do casal para construir um lar com um subjetivo ânimo de permanência que o tempo objetivamente confirma. Isto é família, pouco importando se um dos parceiros mantém uma concomitante relação sentimental a-dois. No que andou bem a nossa Lei Maior, ajuízo, pois ao direito não é dado sentir ciúmes pela parte supostamente traída, sabido que esse órgão chamado coração 'é terrra que ninguém nunca pisou'. Ele, coração humano, a se integrar num contexto empírico da mais entranhada privacidade, perante o qual o Ordenamento Jurídico somente pode atuar como instância protetiva. Não censora ou por qualquer modo embaraçante (...) 17. No caso dos presentes autos, o acórdão de que se recorre tem lastro factual comprobatório da estabilidade da relação de companheirismo que mantinha a parte recorrida com o de cujus, então segurado da previdência social. Relação amorosa de que resultou filiação e que fez da companheira uma dependente econômica do seu então parceiro, de modo a atrair para a resolução deste litígio o § 3º do art. 226 da Constituição Federal . Pelo que, também desconsiderando a realação do casamento civil que o então segurado mantinha com outra mulher, perfilho o entendimento da Corte Estadual para desprover, como efetivamente desprovejo, o excepcional apelo. O que faço com as vênias de estilo ao relator do feito, ministro Março Aurélio ".

Tem prevalecido nos Tribunais Superiores o entendimento de não se admitir uma relação de concomitância entre casamento e união estável, em contrapartida o Tribunal Gaúcho já decidiu o seguinte:

"Apelação. União dúplice. União estável. Possibilidade. A prova dos autos é robusta e firme a demonstrar a existência de união entre a autora e o de cujus em período concomitante ao casamento de 'papel'. Reconhecimento de união dúplice. Precedentes jurisprudenciais. Os bens adquiridos na constância da união dúplice são partilhados entre a esposa,a companheira e o de cujus. Meação que se transmuda em 'triação' , pela duplicidade de uniões. Deram provimento, por maioria, vencido o des. Relator" (TJRS, Apelação Cível 70019387455, 8ª Câmara Cível, Rel. Rui Portanova, j. 24.05.2007).

Neste sentido, o mesmo Tribunal contempla outros julgados: Apelação Cível 70011962503, 8ª Câmara Cível, Rel. Rui Portanova, j. 17.11.2005 e Apelação Cível 70009786419, 8ª Câmara Cível, Rel. Rui Portanova, j. 03.03.2005.

A doutrina ainda se subdivide e aponta diferenças entre o concubinato de má-fe e de boa-fé. Concubinato de boa-fé seria a chamada "união estável putativa", ocorre quando uma das partes, ignora o outro relacionamento do parceiro, acreditando que está vivendo um relacionamento único, sem perceber que está vivendo uma união paralela. Já o concubinato de má-fe, é aquele em que a concubina tem ciência de outra relação anteriormente estabelecida pelo seu parceiro. Esta espécie é, normalmente, deixada à margem do Direito de Família, e grande parte da doutrina e jurisprudência alega que não pode ser reconhecido nenhum direito à relação, sob pena de infringir o princípio da monogamia.

Ainda que se possa argumentar pela possível "imoralidade" do relacionamento concubinário, ou seja, de se manter um relacionamento com pessoa sabidamente casada, o vínculo que une estes parceiros,pelo menos no caso em questão, com duração de 28 anos, também é um vínculo afetivo, algo os uniu durante este período. Não se pode conceber a idéia que o status de casado de um dos parceiros faça o vínculo de afeto desaparecer.

O Estado deve zelar pela família, e essa deve se reger por princípios constituicionais, todavia, não pode o moderno operador do direito se restringir a apenas aplicar o que está na Lei, é preciso que cada situação seja analisada dentro de suas particularidades, afinal estamos tratando de pessoas e não apenas de pedaços de papel.

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